A lanterna apagou

China encosta setor petroquímico mundial contra a parede

A China é o fiel da balança das perspectivas para o plástico mundial este ano. EUA por ora à parte, o 1º Mundo patina em deflação e petróleo e o mercado de commodities rumam para preços ao rés do chão. No coração do tornado, a China, em dívida recorde, amarga o corte nos incentivos do governo que fizeram sua festa do consumo de 2008 a 2013.Emergentes como o Brasil e Rússia sentem a virada influindo nos PIBs declinantes e exportadores como Japão e Alemanha digerem o sapo da queda nas encomendas chinesas. A economia da China caiu do precipício dos estímulos irretornáveis, quadro que mantém produtores de polímeros pendurados no trapézio sem rede embaixo, deixa nu e cru nesta entrevista John Richardson, consultor sênior especialista em Ásia e blogueiro do portal britânico Icis
(e-mail: john.richardson@icis.com).

Richardson: petroquímicas erraram nas previsões.
Richardson: petroquímicas erraram nas previsões.

PR – Poderia explicar o movimento da China rumo a uma nova realidade econômica e seus efeitos sobre os preços do petróleo e o fim da bolha global de commodities?
Richardson – A China reagiu à crise financeira global de 2008 com o maior programa de estímulos já empreendido por um país com suas dimensões na história da economia mundial, de montante correspondente a US$586 bi. O objetivo era repor, através do consumo doméstico fortalecido, a perda de empregos causada pela moderação das exportações para o Ocidente. Isso funcionou à custa de uma grande bolha de investimento na construção e manufatura. Ninguém se importava se determinado condomínio ou projeto de fabricar produtos como químicos condizia com a oferta e demanda. Tudo o que importava era se a realização do projeto gerava crescimento econômico no curto prazo. Analistas fora da China, em particular de bancos de investimento, afirmavam que o dinheiro assim bombeado na economia chinesa estava gerando uma classe média nos moldes ocidentais. Acreditavam que esse gasto suplementar do governo criara uma vasta quantidade de chineses ricos que manteriam por muitas décadas o crescimento da demanda  nos níveis vistos de 2008 a 2013, o período de vigência do programa de estímulos oficiais. Na mesma esteira, robustos acréscimos foram feitos  na capacidade internacional de petróleo, carvão, cobre e alguns polímeros e químicos, amparados nas previstas taxas de forte crescimento da demanda da China. Mas esses investimentos ignoraram o que já era claro no início do programa de estímulos, ou seja, que ele resultaria em grande aumento da dívida chinesa.

PR – Como dimensiona esse aumento?
Richardson – Relatório da consultoria McKinsey atesta que a dívida quase quadruplicou  de 2007 a 2014, atingindo então 28% do PIB. Dívida em si não é problema se você pode pagar. Mas o mesmo relatório, emitido em fevereiro de 2015, levantava três fatos preocupantes: metade dos empréstimos estão ligados  ao superaquecido mercado imobiliário; perto da metade dos empréstimos ficou por conta de agentes financeiros fora da regulamentação bancária e, por fim, a dívida de muitos governos locais (esfera municipal e estadual) é provavelmente insustentável. Ao assumirem seus cargos em 2012, o presidente  Xi Jinping e o Primeiro Ministro Li Keqiang deixaram evidente que os estímulos seriam retirados para controlar a crise da dívida, processo iniciado em 2014.

PR – Qual o impacto dessa mudança na China sobre a superoferta e excedente de capacidade de resinas como poliolefinas, PVC e PET?
Richardson – O resultado da retirada dos estímulos econômicos é o excedente de petróleo, metal, carvão e de polímeros  como os citados na pergunta. Muita capacidade foi erguida na suposição equivocada de crescimento da demanda.

PR – As petroquímicas falharam em reconhecer a gravidade da retração da China?
Richardson – Não. Elas pensavam que, mesmo com a China diminuindo sua marcha, seu consumo é muito superior ao de 10 anos atrás e assim, ainda que as taxas de crescimento declinem, os volumes incrementais extra, acrescidos a cada ano, seriam enormes. As petroquímicas também argumentavam   que o forte crescimento da demanda em outros mercados emergentes  compensariam a redução da velocidade da expansão chinesa. No entanto, elas ignoraram dois fatos:
a)    a China já havia alcançado autossuficiência em determinados petroquímicos e polímeros, a exemplo de PVC, PET e ácido tereftálico purificado (PTA, componente de PET). Além disso, o país caminha para a autonomia na produção de polietileno (PE) e polipropileno (PP) nos próximos 5-10 anos.
b )    A demanda notada em outros mercados emergentes é ultra pequena perante a chinesa. Mesmo que as taxas de crescimewnto sejam fortes nesses mercados, levará muitos anos para eles alcançarem o patamar da China.

PR – Como vê o impacto da Nova realidade da China sobre a diferença de preços entre petróleo, nafta e gás natural norte-americano?
Richardson – Os preços do barril ainda não chegaram ao fundo do poço; podem chegar a US$ 20 ou menos. Isso impulsionará a competitividade dos crackers base nafta frente aos base etano de concorrentes nos EUA e Oriente Médio. Os preços do petróleo devem permanecer em níveis muito baixos nos próximos anos.

PR – Mais estímulos do governo ajudariam a China a resolver seus problemas econômicos?
Richardson – Não. Cada novo dólar hoje acrescentado à dívida está provavelmente pesando mais para subtrair do que para somar para o crescimento do PIB da China, em razão da escala da superoferta na manufatura e lançamentos imobiliários. Em relação ao investimento feito, o consumo doméstico chinês permanece muito baixo como um condutor do crescimento do PIB. Além disso, a expansão do consumo caminha para enfraquecer porque as pessoas compreendem que as dolorosas reformas econômicas são uma realidade. Portanto, mesmo que o governo chinês pudesse bancar o lançamento de um programa maciço de estímulos – hipótese inviável dadas as reservas financeiras oficiais bastante inferiores ao que muita gente pensa – a iniciativa falharia.

PR – A indústria chinesa de transformação de plásticos opera  com excedente causado pela onda de investimentos no setor entre 2008 e 2013, no rastro do programa de estímulos do governo. Ele acabou. E agora?
Harrison – Vem aí a consolidação das empresas do setor. •

Compartilhe esta notícia:

Deixe um comentário