“O Paraguai tem fortes fundamentos econômicos, endividamento baixo, razoáveis reservas e pequenos desequilíbrios fiscal e externo”, diagnosticou o Fundo Monetário Internacional (FMI). “O principal desafio é impulsionar o desenvolvimento econômico e social”. A análise do FMI foi trombeteada em 2014, mas continua irretocável. Com base nela e na reprovação dada em janeiro pelo mesmo FMI ao Brasil na deriva, o vizinho Paraguai desponta aos olhos das empresas brasileiras de manufatura, inclusas transformadoras de plásticos, como um lugar onde, além de serem recebidas de braços abertos e ganharem acesso privilegiado aos mercados mundiais, podem trabalhar em paz sem bafo de governo na nuca. Nesta entrevista, Rodrigo Maia e Fernando Otsuzi, porta-vozes da trading Sainte Marie, mostram como é bem mais verde a grama do nosso vizinho.
PR – Quantas indústrias de manufatura brasileiras hoje operam no Paraguai?
Maia – Hoje são cerca de 100 instaladas e produzindo no país e, por sinal, 80% das chamadas maquiladoras possui capital brasileiro.
Otsuzi – Os segmentos dos entrantes iniciais foram o automotivo e o têxtil e eles foram fundamentais por comprovar a viabilidade operacional das vantagens oferecidas pelo Paraguai. Um sinal dessa confirmação foi a constituição de 112 empresas brasileiras no país em 2015.
PR – Embora sua economia venha crescendo e as contas fiscais estejam sob controle, o Paraguai tem logística precária e um governo de baixa capacidade de investimento em infraestrutura. Isso não inibiria os planos de uma indústria brasileira produzir no país?
Maia – Grande parte das subsidiárias brasileiras opera em Cidade do Leste, por estar na fronteira (cerca de 11km) com o Brasil. Basta cruzar a Ponte da Amizade e pegar o modal rodoviário. De outro ângulo, vejo na carência de infraestrutura uma grande oportunidade para empresas brasileiras do ramo. Para melhorar essas condições, o governo homologou a lei de Aliança Público Privada (APP), marco regulatório para reforçar a segurança a investimentos externos na infraestrutura do país.
Otsuzi – Até 2018, o Paraguai terá investido US$7,5 bi em obras públicas e, via APPs, acima de US$1 bi na melhoria de mais de 800km de rodovias. Embora seja grande gerador de energia elétrica, a malha de distribuição do país está passos atrás e uma das soluções para atrair indústrias foi criar zonas francas em forma de condomínios industriais na fronteira com o Brasil e munidas da infraestrutura necessária, inclusas subestações de energia.
PR – Quais os principais estímulos dados a indústrias pelo país?
Maia – A base dos incentivos apóia-se na Lei de Maquila, lei 60/90 e na zona franca industrial, com suspensão e exoneração do imposto de importação e pagamento de 1% para o regime de Maquila e 0,5% na zona franca no momento da exportação. Há isenção de imposto de renda apenas para exportação e dividendos e royalties não são tributados. O Paraguai possui apenas um imposto IVA, com alíquota de 10%, mesmo percentual da alíquota de imposto de renda para pessoa física e jurídica.
Otsuzi – Além do mais, o país oferece acesso mais privilegiado a economias do peso dos EUA, União Europeia e Japão através do Sistema Geral de Preferências.
Maia – Isso faz com que o produto paraguaio desfrute alíquota de importação zero ou reduzida nos principais mercados mundiais.
Otsuzi – Vale lembrar também o ganho aferido no fluxo de caixa para formar o estoque. Ao deixar de comprar de um fornecedor sediado no Brasil em favor da subsidiária no Paraguai, uma empresa brasileira deixará de cobrar, na sua operação de venda, o adicional médio de 50% sobre a mercadoria, correspondente aos impostos devidos no faturamento dentro do Brasil. Eles não existem na compra via Paraguai. Ou seja, todos saem ganhando.
PR – Poderia comparar os atrativos do Paraguai com as condições do Brasil?
Maia – A burocracia é bem menor, a exemplo da abertura de uma empresa em 30 dias contra 120 no Brasil. O custo trabalhista paraguaio ronda 35% frente 102% no Brasil. No Paraguai, o imposto de renda é 10%, enquanto no Brasil, oscila entre 27% a 34%. Ainda no plano fiscal, o Brasil tem vários impostos (PIS, Cofins, IPI, ISS, ICMS etc.), enquanto no Paraguai vigora apenas o IVA. A mão de obra do país requer treinamento, mas 70% da população está na faixa de 35 anos.
Otsuzi – A energia é 70% mais barata que a brasileira e a ausência de imposto de importação na entrada do insumo faz com que, de largada, o custo médio do produto desembarcado seja 14% mais baixo que no Brasil.
PR – Quais as facilidades tarifárias para a importação de bens de capital e matérias-primas?
Maia – A lei 60/90 isenta a taxação sobre bens de capital. A Lei de Maquila suspende o pagamento de imposto para insumos e a zona franca industrial exonera o pagamento de impostos para matérias-primas e bens de capital.
Otsuzi – Em relação às máquinas, o governo permite a transferência de equipamentos em uso em outro país para a nova fábrica no Paraguai, agilizando e barateando assim a montagem da planta. Quanto à matéria-prima, além da exoneração de todos os impostos na sua entrada, há a possibilidade de mantê-la dolarizada em estoque, pois o sistema bancário paraguaio permite o depósito e a movimentação de dólares. No caso de insumos com preços globais dolarizados, isso evita que o estoque possa sofrer aumentos bruscos devido a variações cambiais após a importação. No Brasil, indústrias e distribuidores importados conhecem bem este pesadelo. •