O comércio mundial posto em xeque por rosnados protecionistas, a aversão ambientalista aos plásticos e a contagem regressiva iniciada para a super oferta de polietileno (PE) nos EUA acendem, com a retomada no Brasil tolhida pela política e a bola de neve da dívida pública& crise fiscal, um caldeirão de elucubrações sobre o desfecho disso tudo no mercado interno. Um prato cheio para José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), mandar ver nesta entrevista.
A guerra comercial EUA x China agrava a colocação internacional do excedente norte-americano de PE, com entrada total em campo esperada para 2020. A América do Sul é um dos canais de desova sujeitos a entrevero em preços entre a resina importada e a doméstica. Como a Abiplast encara a possibilidade de pedidos de antidumping para PE dos EUA serem encaminhados ao governo brasileiro?
Encaramos com preocupação a possibilidade de medidas de restrição ao acesso a essas matérias-primas. Entendemos a importância dos instrumentos de defesa comercial, mas compartilhamos com as novas visões apresentadas por setores do governo, principalmente o Ministério da Fazenda. Segundo elas, a argumentação sobre a aplicação de antidumping deve extrapolar a análise de “dano e nexo causal” e incorporar a discussão mais ampla de interesse público dessa medida e seus impactos no universo produtivo, inflação e empregos.
É preciso, nessas análises, considerar as estruturas das indústrias peticionárias, as implicações concorrenciais a jusante da cadeia causadas pela sobretaxa, bem como seu tempo de vigência. O objetivo é evitar que setores passem a contar com direitos de defesa comercial intermináveis, por conta das inúmeras renovações feitas apenas sob o alegado risco de se voltar a ter importações das origens penalizadas com antidumping quando livres desse ônus.
Hoje em dia, 45% das matérias-primas consumidas pelo transformador nacional de plástico têm algum tipo de antidumping. Caso fosse instaurado processo de investigação antidumping sobre PEs, esse percentual subiria para praticamente 85% das principais resinas processadas, fornecidas por players altamente concentrados e restringindo assim a possibilidade de concorrência internacional. Tal constatação não pode ser deixada em segundo plano na análise da concessão de um direito antidumping.
Um número crescente de indústrias finais vip alardeia planos de apoio à economia circular que incluem barrar as embalagens plásticas descartáveis ou de reciclagem complexa e onerosa. Qual o futuro que enxerga, então, para alternativas como filmes laminados para alimentos, de coleta pós consumo ultra complicada, e para caixas cartonadas, cuja tecnologia de reciclagem é tão cara que só a Tetra Pak a efetua no Brasil?
Os anúncios e compromissos assumidos por esses players globais, como Unilever, Coca-Cola, Nestlé, Walmart e McDonald’s, quanto a utilizar embalagens mais recicláveis e, por vezes, até garantir a reciclagem de todos recipientes por eles colocados no mercado, evidenciam um movimento global em favor de soluções cada vez mais sustentáveis.
Além de desafiadores, tais movimentos constituem uma grande oportunidade de se estudar novos modelos dentro do negócio de embalagens e de se oferecer a essas grandes marcas (a serem seguidas por concorrentes menores) produtos mais adequados às demandas afinadas com a nova realidade. Por exemplo, embalagens dotadas de rastreabilidade ou cujo refugo seja mais reaproveitável, atributos que se traduzirão em produtos com maior valor adicionado. As indústrias de transformação e reciclagem de plásticos dispõem de tecnologia à altura dessas expectativas e são capazes de fornecer soluções melhores de embalagens, com maior índice de reciclabilidade.
Para internalizar esses movimentos e tendências em nossa cadeia, a Abiplast está promovendo uma rede empresarial de cooperação para o plástico. A ideia é envolver todos os agentes cuja atuação esteja diretamente ligada e seja impactada por essas novas demandas e formas de fazer negócios. Portanto, estamos trabalhando numa rede de ações com petroquímicas, transformadores, recicladores, cooperativas, varejo e marcas. Ela contempla uma construção colaborativa, incorporando as nuances e particularidades de cada elo da cadeia, sem restringir-se somente às salas fechadas de uma empresa. As primeiras reuniões para isso visam definir ações para fomentar negócios na lógica da economia circular.
Com base nas pressões ambientalistas hoje globalizadas, o Brasil caminha para engrossar o efetivo de países que vêm vetando as sacolas plásticas do comércio?
Legislações e projetos que pregam o banimento do uso de determinados materiais são constantes no nosso dia a dia. Temos mapeado mais de 200 projetos de lei que afetam nosso setor de alguma forma. Faz parte da nossa rotina institucional promover encontros com parlamentares para esclarecimentos técnicos, pois quase todos os projetos de banimento se valem de justificativas simplificadas, sem muita noção do funcionamento da produção ou do mercado. Temos atuado com regularidade em Brasília, Estados e municípios.
A missão da Abiplast é mostrar à sociedade a importância e a eficiência desses produtos e como minimizar problemas gerados, em alguns casos, pelo mau uso ou descarte incorreto. Vale lembrar que, no caso específico das sacolas na capital paulista, a legislação as utilizou como ferramenta para fomentar a logística reversa de produtos pós-consumo. Ou seja, as sacolas plásticas passaram a ser a solução do problema. Sempre foram utilizadas pela população como meio para se livrar do lixo doméstico. Hoje, porém, tal conveniência foi legitimada pela regulamentação para contribuir com o descarte correto de resíduos recicláveis. Dentro dessa linha de raciocínio, fica demonstrado como as soluções podem ser alternativas ao banimento.
Vetar um produto plástico é resolver apenas parte do problema. Por ser solução simplista, pois não tem a visão sistêmica do funcionamento da sociedade, ela pode criar outras dificuldades, a depender da alternativa eleita para substituir o item plástico banido. Temos o exemplo de materiais sucedâneos que são colocados como alternativa aos plásticos, mas dotados de Análise de Ciclo de Vida (ACV) contendo muito mais impacto ambiental negativo do que eles. Em outros casos, se coloca como solução a lavagem de produtos sucedâneos como substituição aos transformados, mesmo com o Brasil sob grande crise hídrica (segundo o Ministério da Integração Nacional, 917 municípios amargavam situação de emergência por estiagem em mapeamento feito até 13 de março último).
A melhor forma de tratar essas questões do impacto do resíduo plástico não é banir, mas pelo diálogo propositivo. Ações de logística reversa, educação, investimentos em tecnologia e inovações e a indução de novos negócios considerando a lógica da economia circular, embora possam ser de médio prazo, são as soluções para todos os produtos.•