O descarte bandido

Mais uma vez o mundo se curva ante o Brasil...

Mais uma vez o mundo se curva ante o Brasil. Depois da tomada de três pinos, da favela como atração turística e dos penduricalhos nos vencimentos do Judiciário, chegou a vez do planeta ficar de quatro com o descarte bandido.

Do site O Globo em 10 de janeiro: “RIO – Novo chefe executivo do Centro de Operações Rio (COR) da prefeitura, o coronel do Exército Guilherme Lima Torres Sangineto disse nesta terça-feira que, a partir desta quarta, quando cair um temporal na cidade, a Polícia Militar será acionada para garantir a segurança das equipes que trabalham na desobstrução de bueiros. Isso, segundo ele, tem um motivo: bandidos estariam usando sacos plásticos para entupir ralos, com o objetivo de provocar alagamentos e assaltar motoristas e pedestres ilhados”.

Este artigo poderia tomar agora aquele manjado rumo dos males causados pela educação no subsolo do poço, haja vista as taxas de evasão no ensino fundamental ou no que dá a formação inferior no nível superior. Falam por si viadutos que desabam todo ano, ou então, o fato de oito em cada 10 recém-graduados não saberem sequer interpretar uma mamografia e diagnosticar diabete no último exame do Conselho Regional de Medicina de São Paulo, prova aliás na qual 40% dos médicos avaliados saíram reprovados. Precisa dizer mais?
O problema é que martelar apenas a tecla do despreparo como justificativa para passar a mão em cabeça de bandido, com aquela benevolência típica de sociólogos e devotos dos direitos humanos, constitui linha de raciocínio afrontosa e tão batida que o público que ainda lê algo além dos títulos pára por aqui e vira a página entre dois bocejos. Na realidade, o buraco é mais embaixo da saia dos bem comportados pitacos socioeconômicos de costume. Pior, ele passa por certas ponderações tidas como politicamente incorretas pela cultura ou impostura (escolham) hoje em vigor.

Direto ao ponto: a educação brasileira é o que é porque, se melhorasse, nosso político-padrão perderia eleitor. Melhor então falar bonito frente às câmaras e, fora delas, deixar tudo como está. Adiante: imbuídas do melhor espírito do desenvolvimento sustentável, grandes empresas se empenham há mais de uma década para sensibilizar a população mal informada para o descarte correto do refugo pós-consumo. Essa didática catequese tem sido frustrante, provam volumes como os de plástico recuperado ou o lixo largado pelos blocos no carnaval. Manda a lógica que esta abordagem de conscientização deveria então mudar o tom para surtir efeito, teria de ser mais direta e incisiva para o povão captar a mensagem. Mas aí tem um porém de marketing: empresa alguma vai topar enfiar o dedo na cara do consumidor e chamá-lo de porcalhão mal educado nem clamar pela sua penalização através da aplicação com o devido rigor da multa contra poluição prescrita na Lei de Crimes Ambientais. Além do que, não só falta ao governo impor respeito a essa lei, como sobram contrasensos jurisdicionais no apoio dele à causa da sustentabilidade. Por exemplo, resina virgem é menos tributada que a reciclada e carro velho, sujeito a acidentes e poluidor paga IPVA inferior ao do carro novo, mais econômico, seguro e menos danoso à natureza.
Por fim, o plástico é um material que tornou-se refém de suas virtudes. Por ser solução barata e eficaz, contemplou uma infinidade de produtos com acesso a escalas de massa, estas dominadas pelo consumidor de baixa renda e a educação que se sabe no Brasil. Junto a isso, predicados como a leveza, artificialidade, praticidade, disponibilidade e comodidade grudam o plástico na cultura do descartável que marca em tudo estes tempos.
Para o bem e – aí estão o descarte bandido e os assaltos com revólver de brinquedo – para o mal. •

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1 Comentário

  • O editorial deste mês me trouxe muitas reflexões pela abrangência abordada pelo autor que passa pela educação até a percepção de baixa qualidade dos plásticos que caem no senso comum da população…
    Com tantas variáveis aqui nos sobra buscar a união do setor por políticas alinhadas de defesa e educação em todos os ciclos sociais que vivemos, digo isso porque tenho no meu ciclo pessoas de outros segmentos de boa educação que pouco valoriza e entende como os plásticos podem ser aliados e não somente bandido, e que falamos sobre os vários benefícios e baixo impacto ambiental frente a outros materiais e isso gera mudança de paradigma e algumas visões bem interessantes, temos um longo caminho ainda…
    Vamos em frente!
    Abraço

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