Distribuidores de resinas sempre martelaram a tecla de que, embora sejam indiscutíveis os pesadelos trazidos pelas recessões, como máquinas paradas e as dificuldades de acesso a financiamento, a gestão do negócio seria, faça sol ou chova granizo na economia, o calcanhar de aquiles dos transformadores menores. Pois a necessidade ensina e alguma coisa começa a mudar no universo das indústrias em geral de baixa envergadura, constata Luiz Rabi, economista da Serasa Experian, em entrevista a Plásticos em Revista. “Ao longo dos últimos anos, a pontualidade de pagamentos das micro e pequenas indústrias tem se mantido estável”, ele considera. “Em 2015 e 2016, o índice de pontualidade chegou a 94,4% e, no acumulado até abril deste ano, atingiu 94,3%.Ou seja, a cada mil pagamentos efetuados, 943 foram realizados na data de vencimento ou com atraso máximo de uma semana. O quadro demonstra que essas indústrias estão mais preparadas para lidar com a crise, pois nos demais setores, comércio e serviços, a pontualidade de pagamentos caiu durante os últimos três anos”.
A gestão do caixa com cadeado embica para o arrefecimento da demanda por crédito entre indústrias de todos os portes. Em 2016, especifica o porta voz da Searasa Experian, a procura das empresas por financiamento caiu 2,2% perante os registros de 2015, “resultado puxado pela queda de 5% observada na indústria”, completa o economista. De janeiro a abril último, ele assinala, a demanda das empresas por crédito recuou 2,6% e, no bojo deste número, a indústria voltou a ser o setor com maior taxa de declínio: -5,4% . “Assim, tanto em 2016 como até agora o setor industrial tem liderado a queda na demanda das empresas por crédito”, avalia Rabi. “Isso ocorre porque ele é justamente o setor de crescimento mais afetado pela crise econômica”.
Com base na posição de março último da Serasa, Rabi projeta em torno de cinco milhões o contingente de empresas inadimplentes no Brasil. “As indústrias constituem 8,7% do total, um percentual que tem se mantido relativamente estável, pois das 4,4 milhões de empresas inadimplentes aferidas em março de 2016, uma parcela de 8,9% cabia às indústrias”, distingue o economista. No universo da inadimplência, nota Rabi o setor de maior aumento em sua participação foi o de serviços. “Em março de 2016, ele correspondia a 45% do total e, um ano depois, chegava a 46,5%”. Rabi atribui essa trajetória ao predomínio de micro e pequenas empresas no setor de serviços. “São companhias menos preparadas para o enfrentamento de uma crise tão longa quanto à nossa”.
A transformação de plástico não é exceção entre as indústrias de manufatura açoitadas por três anos a fio de crise. Mas, diante da magnitude dos destroços nos balanços setoriais, seu desempenho não só não tem sido dos mais espezinhados como já são visíveis as perspectivas de uma jornada lenta, a tiracolo do PIB, mas no rumo de uma injeção de sangue bom nos seus números, confia nesta entrevista Edison Terra, vice-presidente da Unidade de Negócio de Poliolefinas, Renováveis e Europa da Braskem.
PR – Como interpreta a trajetória dos pedidos de recuperação judicial dos clientes diretos da Braskem desde 2015?
Terra – A quantidade de ocorrências de recuperação judicial tem se mantido estável nos últimos dois anos. Acreditamos que os números deste período ficam um pouco acima da média histórica, mas isso tem relação com o momento recessivo vivido por nossa economia. Pontualmente, tivemos casos similares em anos anteriores. Se compararmos com os dados de entidades que monitoram o universo do crédito, como Serasa, temos a impressão de que os indicadores do setor plástico são melhores que a média da indústria. É possível que a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) e a Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas Plásticas e Afins (Adirplast) tenham um índice destoante, por terem acesso a uma amostragem diferente dos produtores de resinas.
PR – Com base nessa visão animadora, como deve ficar a incidência desses pedidos de recuperação judicial até dezembro?
Terra – Em geral, os pedidos de recuperação judicial só acontecem depois de as empresas esgotarem as demais alternativas disponíveis. É difícil prever a evolução deste número no curto prazo, mas se considerarmos a recuperação do consumo, ainda que tímida, sustento ser possível dizer que, a médio prazo, esses indicadores tendem a diminuir. De acordo com os dados da Braskem, a demanda interna de resinas (polietileno, polipropileno e PVC) no primeiro trimestre de 2017 foi de 1,2 milhão de toneladas.O volume traduz uma expansão de 5% em relação ao mesmo período em 2016. Daí estarmos projetando para este ano um crescimento da indústria de transformação entre 2% e 3%. Segundo a projeção da Abiplast para 2017, a produção física de artefatos plásticos deve apresentar resultado positivo, com aumento de 2,15% em relação a 2016. Para este ano, a entidade, conforme divulgado em seu site, confia em crescimento de 1,9% no faturamento do setor, atingindo a casa de R$ 53,6 bilhões. Além disso, os líderes e gestores das empresas têm ampliado seu conhecimento na crise e buscam otimizar a produção, reduzir custos e operar de forma mais enxuta. Por sinal, Braskem e Abiplast têm procurado colaborar nesse sentido,por meio de ações de treinamento em finanças e gestão do programa Plano de Incentivo à Cadeia do Plástico (PicPlast).
PR – Na média geral de 2015 a maio de 2017, poderia repartir os pedidos de recuperação judicial constatados entre transformadores ligados a produtos primários e a bens duráveis?
Terra – O número de casos é pequeno para permitir que se note uma tendência específica de um setor ou outro. Houve um decréscimo generalizado na atividade industrial que acabou atingindo boa parte dos segmentos da economia.
Em contrapartida, as indústrias sobressaem no cenário das empresas devedoras em pane seca financeira. “Infelizmente, batemos em 2016 um recorde histórico de pedidos de recuperações judiciais”, expõe Rabi. “Foram 1.863 pedidos e as indústrias responderam por 24% deles, por sinal uma participação inferior à registrada em 2015, quando o setor industrial esteve à frente de 28% do saldo de 1.287 pedidos no período, demonstrando que a situação de insolvência no comércio e serviços se agravou mais do que no setor industrial”. Em relação ao exercício de 2017, o economista informa que a Serasa ainda não fez qualquer levantamento setorial. “Mas já notamos um recuo de 24% no total de pedidos de recuperação judicial de janeiro a maio último em relação ao mesmo período em 2016”. “Quanto aos pedidos de falências contra indústrias, Rabi os situa em 676 em 2016 e os equipara a 36,5% do total. “É mais ou menos o nível de participação verificado em 2015, quando a indústria representou 36,1% do saldo de 644 pedidos”.
A nitroglicerina despejada na barafunda política pela delação de Joesley Batista não alterou, por enquanto, as expectativas da Serasa para a economia a curto prazo. “Tudo aquilo que prejudica a capacidade do governo em seguir adiante na aprovação das reformas pelo Congresso, principalmente a da Previdência, afeta de forma negativa o quadro econômico, a exemplo desta delação”, pondera Rabi. “Mas, pela nossa avaliação, a agenda das reformas deverá prosseguir, provavelmente com certo atraso, mas sem inviabilizá-las. Assim, ainda está mantido o nosso cenário de crescimento econômico de 0,5% para 2017 e 2,5% para 2018”.
O mesmo espírito imbui as previsões de outro termômetro do crédito no Brasil, a Boa Vista SCPC. Sem fixar percentuais para o PIB, o economista Flávio Calife confirma a Plásticos em Revista não ter sentido a premência de revisar com lupa suas projeções em função da metástase na vida econômica deflagrada na jugular do governo pela metralhadora giratória da JBS. “Não fizemos muitas alterações”, ele reitera. “Entendemos que a crise não deve influenciar significativamente os ajustes que devem ser feitos na economia, mesmo que em ritmo mais lento. Mas as reformas devem continuar a acontecer a partir de 2018, quando esperamos a retomada da estabilidade política”.
Pelo monitoramento da Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas Plásticas e Afins (Adirplast), em torno de 70 empresas atendidas por este canal de vendas, dominadas por transformadores de menor porte, pediram recuperação judicial entre 2011 e 2016. “O atual regime de recuperação judicial já caducou”, vaticina Laércio Gonçalves, presidente da entidade e da distribuidora Activas. “O próprio governo Temer já tenta emplacar uma nova regulamentação, mais justa para todas as partes e desprovida de populismo barato. Hoje em dia, as empresas que entram em recuperação judicial não se reerguem e só prejudicam o nosso setor ”.
Salto nas falências em 2016
Em sua análise da pulsação do crédito, Calife coloca no mesmo compartimento das empresas em geral os setores da indústria e serviços”. Ao examinarmos os indicadores da Pesquisa Trimestral de Condições de Crédito, compilada pelo Banco Central, nota-se um comportamento generalizado de queda na demanda por financiamento, focada em empresas de todos os portes, assim como para consumidores e procura por crédito habitacional”, descortina o economista da Boavista SCPC . “Tanto em 2015 quanto em 2016, com base na avaliação pelos valores acumulados em quatro trimestres, houve um grande declínio desta demanda e que só começa a ser revertido no último trimestre do ano passado, inflexionando no primeiro trimestre de 2017. Mas vale ressaltar que a retomada ainda é incipiente, distante da média histórica, e assim deverá permanecer até, pelo menos, meados de 2018”.
A Boa Vista SCPC calcula a inadimplência das empresas através da soma dos principais mecanismos de apontamento. “Tratam-se de cheques devolvidos, títulos protestados e registros realizados na base da nossa instituição”, sumariza Calife. Pelo exame dos dados acumulados em quatro trimestres frente ao mesmo período do ano anterior, o economista pondera ser possível observar em 2015 o início da escalada do fluxo de inadimplência. “Ele inicia o primeiro trimestre de 2015 com elevação de 5,5%, atingindo seu ápice no triênio um ano depois, com alta de 9,6%, passando a desacelerar a partir daí, com 0,6% de crescimento registrado no primeiro trimestre de 2017”.
Calife libera os indicadores da Boa Vista SCPC relativos a indústrias sem caixa para honrar suas dívidas. No balanço consolidado de 2015, foram constatados 385 pedidos de recuperação judicial e 706 de falências. Em 2016, o setor industrial registrou 485 pedidos de recuperação judicial e 825 de falências. A varredura da Boa Vista SCPC aponta que, de janeiro a abril de 2017, a categoria das indústrias colocou 120 pedidos de recuperação judicial e 197 de falências. De janeiro a maio, a Boa Vista registrou 163 pedidos de indústrias por recuperação judicial e 267 de falências Em geral, os dados de solvência apresentam tendências similares, independentemente do setor, julga Calife. “No caso das indústrias, houve um grande aumento das falências em 2016 perante 2015, número que atenuou consideravelmente no acumulado até abril de 2017, em linha com o indicador agregado de falências e recuperação judicial divulgado mensalmente pela Boa Vista SCPC”, observa o economista. “Como até o momento a tendência tem sido a de desaceleração e até mesmo queda de alguns desses indicadores, espera- se para o resto do ano a manutenção do fluxo, que deverá trazer os primeiros números anuais negativos desde o término de 2014”. •