Mesmo com desemprego e empobrecimento recordes, as pessoas insistem em manter o hábito de comer. Apesar do tom de sátira, tem lógica essa explicação para o setor de embalagens ter conseguido andar de lado em 2016, um empate com sabor de vitória se comparado ao rombo no consumo de plásticos para bens duráveis atirados pela recessão na UTI, como carros, linha branca e imóveis.
A consultoria Maxiquim fez a biópsia da calmaria ao longo do ano passado nessas embalagens senhoras de 29% da transformação nacional de plásticos. O exame começa pela visão da cobertura da cadeia industrial, o reduto de poliolefinas – polipropileno (PP) e polietileno (PE). Como expõe Otávio Carvalho, sócio e diretor da MaxiQuim, a demanda brasileira das duas resinas somou 3.856 milhões de toneladas no ano passado contra 3.883 milhões em 2015, um desempenho no qual PP subiu de leve, da ordem de 06%, e PE caiu -1,4%. Em seu cruzamento de dados, Carvalho deixa claro que a demanda de poliolefinas voltou em 2016 ao platô de 2012 e desde 2010 progride (na falta de verbo melhor) a 0,3% ao ano.
Em frente: as importações brasileiras de PP, expõe o pente fino da MaxiQuim, fecharam o último período em 288.000 toneladas versus 258.000 precedentes, com destaque para o avanço de 75% da resina argentina (57.698 toneladas) entre 2015 e 2016. Na seara de PE, as 757.000 toneladas desembarcadas no Brasil em 2016 foi o menor volume importado desde 2010. A Argentina voltou a sobressair com crescimento de 40%, calcula a MaxiQuim, com as remessas feitas entre 2015 e 2016 pela Dow, única produtora de PE no país vizinho. Pelo radar do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o complexo da Dow em Bahia Blanca mandou em 2016 para cá 16.272 toneladas de polietileno de baixa densidade (PEBD), 10.901 do tipo linear e 95.565 toneladas da resina de alta densidade (PEAD).
No quarto trimestre, começa a aflorar mundo afora a produção de PE via gás do primeiro bloco de novas capacidades instaladas nos EUA. Pela lupa da consultoria Icis, a capacidade norte-americana de PEBDL saltará 78% entre 2016 e 2020, enquanto a demanda local não subirá além de 8%. Otávio Carvalho é adepto da corrente “pode sentar que o leão é manso”. Ele sustenta que o previsto excedente de PE não será tão feio como se pintava um ano atrás. “Diversos projetos pisaram no freio ou sofrem com atrasos por motivos como carência de mão de obra e de equipamentos, de modo que a sobra global da resina deverá será absorvido em tempo mais palatável”. Mas o primeiro bloco de novas capacidades nos EUA entra em cena em 2018, ele concorda, gerando superoferta pontual também em razão dos investimentos em poliolefinas na China, reduzindo sua dependência dessas importações. Apenas em PP, assinala Carvalho, contam-se às dezenas as unidades chinesas hoje em montagem. O consultor acha que o excedente pontual de PE a custo imbatível nos EUA deverá ativar a exportação de poucos tipos de filmes norte-americanos para o Brasil, dadas as singularidades do nosso mercado interno. “Filmes impressos importados, por exemplo, não são de fácil transposição para cá, mas tipos como o stretch norte-americano deverão ganhar corpo por aqui”. A propósito, até segunda ordem, assinala o analista, a América do Sul sai do mapa dos investimentos em petroquímica até segunda ordem. “Seus países aparecem agora apenas como mercados consumidores de resinas”.
Retomando o fio das embalagens flexíveis, o estudo da Maxiquim evidencia a apatia do consumo em 2016 com o desempenho dos seus principais mercados consumidores. Pela régua do Instituto Brasileiro de Geográfica e Estatística (IBGE), a produção industrial de alimentos, por exemplo, mudou de -1,7% em 2015 para a miséria de +0,7% em 2016. No caso de bebidas, saiu de -4,9% em 2015 para -2,5% no ano passado.
No rastreamento da consultoria, PEBDL manteve em 2016 a dianteira no consumo brasileiro de poliolefinas em embalagens flexíveis. Foram então extrusadas 924.000 toneladas da resina linear versus 905.000 em 2015. Em PEBD, o consumo alcançou 418.000 toneladas em 2016 contra 445.000 um ano antes, enquanto o saldo de PEAD foi de 188.000 toneladas em 2016 perante 196.000 anteriores. Por fim, 304.000 toneladas de PP seguiram para embalagens flexíveis no ano passado, acima das 290.000 registradas em 2015. Entre as raras boas novas, Carvalho chama a atenção para a presença crescente de filmes biorientados de PP (BOPP) em embalagens, avanço atribuído por ele a desenvolvimentos bem sucedidos aliados à preços competitivos empoleirados na capacidade nacional excedente da película. Ainda assim, o mercado brasileiro de BOPP tem patinado na marca de 140.000 t/a nos últimos exercícios, atesta Davide Botton, diretor da Polo Films.
A produção nacional de embalagens flexíveis, escancara a MaxiQuim, fechou o ano passado com 1.834 milhão de toneladas ou -0,1% sobre 2015, tendo crescido 0,2% ao ano entre 2010 e 2016. O setor faturou R$ 21 bilhões em 2016, com variação nominal de 2% e real de 6% sobre a receita de 2015. Quanto ao consumo aparente de embalagens flexíveis, (produção + importação – exportação), atingiu 1.861.000 toneladas no último período ou -0,2% perante um ano antes, mantendo a trajetória de inércia constatada pela MaxiQuim desde o início da década. Ainda em 2016, o saldo da balança comercial de embalagens flexíveis fechou negativo em 27.000 toneladas, resultado do confronto entre 75.000 toneladas aqui desembarcadas e 48.000 exportadas. Desde 2009, aliás, o Brasil importa mais dessas embalagens do que vende ao exterior, apontam os gráficos da consultoria.
Carvalho vai devagar com o andar nas perspectivas para embalagens flexíveis este ano. A prudência tem a ver com pedras no caminho sabidas de cor por meio mundo, como retomada lenta, crédito restrito, indústrias descapitalizadas e investidores relutantes. Carvalho também cita como adversidade os efeitos da Operação Carne Fraca para amainar as exportações indiretas de embalagens flexíveis. Ele crê em simbólico crescimento de 0,5% no consumo de embalagens flexíveis este ano, apesar de fatores contrários como a massa crescente de desempregados e o aumento nos custos tributários de um punhado de setores nas vestes da desoneração da folha de pagamentos.
De Volta para o Futuro é um filme que o mercado nunca deixa sair de cartaz. •