Nº1 mundial em produtos de limpeza, a Procter & Gamble (P&G) atravessa seu primeiro ano no Brasil ausente do segmento de sabão em pó para lavar roupa. Ela pulou fora ao fechar, em dezembro último, a fábrica do produto em Louveira, no interior paulista. No mesmo complexo, ela passa a focar a fabricação estrita de detergentes líquidos com a mesma finalidade. A P&G já fez isso em outros países mas em sua transposição para o Brasil, a estratégia tem um quê da audácia de um salto no escuro, embora o país seja o terceiro mercado do planeta para produtos de lavar roupas. Afinal, mais de dois anos de recessão e empobrecimento dos brasileiros acentuaram a imagem de artigos movidos a preço para esses sabões e daí o reinado quase absoluto e sem sustos do produto em pó por aqui.
“O uso do detergente em pó remonta aos anos 1950 e, hoje em dia, ele detém 83% do mercado de produtos para lavar roupa e o tipo líquido pega os 17% restantes”, reparte Maria Eugenia Saldanha, presidente executiva da Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins (Abipla). Conforme analisa, os dois redutos hoje voltam-se para a compactação/concentração de formulações e, na esfera dos sabões líquidos, Eugenia afirma ser mais recente a sua entrada no país, empoleirado numa mexida na mentalidade do consumidor. “Esse produto preconiza uma mudança de hábito”, ela percebe.
Detergentes: Pavan Zanetti fecha o cerco no sopro
O setor de limpeza doméstica, com lavadores de roupa em seu bojo, estão no altar dos mercados cultuados pela Pavan Zanetti para suas sopradoras por extrusão contínua e de pré-formas. Para o diretor Newton Zanetti trata-se de um setor em que a briga por centavos é ferrenha e, para dançar conforme a música, ele acena com máquinas de alta tiragem e baixo custo de produção e manutenção. “Temos linhas em condições de receber até 12 cavidades de frascos de detergente por estação e quatro unidades de dois litros por estação”, distingue o dirigente. Na esteira, ele acena a possibilidade de entregar essas sopradoras munidas de rotulagem no compartimento do molde (in mold label/IML), sistema frequente em frascos de dois litros. “É um recurso sedutor para o comprador pois, além de prover a embalagem já rotulada, aumenta o ciclo do sopro em quase dois segundos”, pondera Newton Zanetti. “Mas custa caro, a ponto de não termos vendido sopradoras com IML até hoje”. Em paralelo, ele chama atenção,com base em sua carteira de pedidos, para a migração, por parte relevante do segmento de detergentes, do sopro de polietileno para PET. “Dispomos de sopradoras Petmatic capacitadas a gerar até 7.000 unidades/h de recipientes”, acena Newton Zanetti.
R$ 2 bi em 2020
Mudar hábito de consumo leva tempo mas, na visão da ala dos líquidos, antes tarde do que nunca e a espera vale a pena. No consenso da praça, produzir sabão em pó sai mais caro e menos rentável que a fabricação dos líquidos. Para começar, os insumos são líquidos e sua configuração para pó implica um ônus aos custos e o acréscimo de mais uma etapa à industrialização, pedregulhos inexistentes no âmbito do detergente líquido. Também pesa contra o sabão em pó a difícil compatibilidade entre sua baixa lucratividade e os altos gastos requeridos em maquinário, processos e limpeza fabril. No arremate, atesta-se que o detergente líquido supera o rival em pó em volume de vendas e valor, a tiracolo do preço algo mais elevado.
Tal como a concorrente Unilever, a P&G não deu entrevista, mas fontes suas asseguraram na mídia que, em termos de performance, o tipo líquido esbanja superioridade na capacidade de diluição, além das vantagens de não deixar resíduos e de requerer menos água na lavagem que o sabão em pó.
Radares setoriais divulgam que, entre 2010 e 2015, as vendas do limpador de roupas líquido mais do que quintuplicaram, enquanto a da versão em pó recuou de leve, abaixo de 2%. Pelo visto, a trajetória do líquido vai pigarrear este ano, pois, numa conjuntura de inflação e pindaíba, seu preço mais alto pavimenta o asfalto para o tipo em pó manter a preferência na gôndola. Em contrapartida, uma corrente de analistas prega que a produção mais simples e acessível, também influenciada por âncoras como a P&G, tende a atrair mais nomes ao terreiro do detergente líquido. O consequente aumento das marcas em disputa poderia contribuir para uma redução no preço de venda que o público final saberia agradecer.
O pote de ouro ao final do arco-íris é de encher os olhos desses investidores. Na bola de cristal da consultoria Euromonitor, a receita do segmento de lavadores líquidos de roupa rondará a casa de R$ 2 bi em 2020 ou 29,5% acima do faturado em 2015. A luminosidade dessa previsão também tem a ver com o potencial sarado. Segundo solfejaram na mídia os porta-vozes da P&G, os detergentes líquidos abocanham 80% do consumo norte-americano, indicador situado em 50% na Europa. Mesmo descontadas as nossas abissais diferenças de poder aquisitivo custo e padrão de vida frente ao Iº Mundo, não passa em branco a fabricante nenhum o fato de o Brasil só perder para China e EUA no pódio dos mercados globais de lavadores de roupa. Para bom entendedor, portanto, os 17% de participação atual detidos pelos produtos líquidos carregam em seu bojo perspectivas de muita liquidez.
Romi antenada na corrente migratória
“Detergentes líquidos são mais práticos, modernos e eficientes na lavagem de roupas do que os tradicionais sabões em pó”, sustenta William dos Reis, diretor da unidade de negócios de máquinas para plásticos da Romi. “Além disso, as embalagens sopradas trazem forte apelo em design e proteção do conteúdo, mais um motivo para a crescente migração do lavador em pó para o líquido”. Jogando o jogo, a Romi assedia essa frente de limpeza doméstica com as sopradoras de polietileno da série C, munidas de válvulas proporcionais para o controle dos movimentos e servo-válvula no controlador de parison com 512 pontos de ajuste de perfil. “Elas correspondem às expectativas na produção de frascos com alças”, ele coloca. “Afinal, dispõem de mesas duplas para altas tiragens, sistema de rebarbação da alça e automação adequada para entregar o fransco pronto em saída orientada”. Na escora da produtividade, encaixa, constam a infra de automação na máquina para testes de pesos, estanqueidade e microfuros. Tal como nas injetoras da Romi, suas sopradoras contarão a partir de 2017 com o comando operacional CM20, de modo a adensar a interação máquina/periféricos/TI no processo, assinala o diretor.
Preferência contestada
Gerson Perussi, presidente da Arco Íris, titular nacional em sabões em pó, interpreta como uma tendência global a decisão da P&G de encerrar sua produção desses detergentes para roupas no Brasil. “Na verdade, o tipo em pó lava melhor, mas, em residências onde as roupas não se apresentam muito sujas, caso de seu uso em ambientes fechados, como escritórios, o sabão líquido vai muito bem”. Por seu turno, Luiz Guilherme Razzo, diretor administrativo da Razzo, com nome feito em líquidos, entende o desligamento da fábrica de sabão em pó em Louveira como algo influenciado por um posicionamento adotado pela P&G em diversos países. “Mas por aqui ainda se usa muito sabão em pó, é um hábito bastante enraizado no consumidor”, reconhece.
Perussi afirma não entender a preferência generalizada na indústria de lavadores de roupa pelo tipo líquido. “A meu ver, o produto líquido emprega embalagem plástica mais cara que a do tipo em pó e sua lavagem da roupa é menos eficiente”, ele coloca. “Em teoria, portanto, o consumidor usa mais quantidade de detergente para limpar roupas muito sujas se empregar o líquido”. Para Luiz Guilherme Razzo, o sabão líquido se impõe porque “dissolve melhor em contato com a água, não importa qual a temperatura, e não agride tanto as roupas”.
Longe do fim
Perussi e Razzo recusam a imagem de um produto fadado à extinção para o sabão em pó. “Não creio muito nessa tendência de diminuir o uso do produto em pó na limpeza de roupa no Brasil”, sustenta o presidente da Arco Íris. “Ele está muito forte na mente das pessoas”. Para o consumidor de alta renda, ele distingue, dependente de um lavador apenas para tirar o suor das vestes, o líquido pode funcionar. “Mas para quem precisa tirar sujidades mais difíceis, o sabão em pó sempre ganhará no custo/benefício”. Já Razzo fundamenta sua visão no cenário internacional. “Nos últimos anos, houve uma migração muito forte do pó para líquido nos EUA e Europa”, observa. “O mercado brasileiro ainda precisa amadurecer melhor essa mudança”. Para completar, ele não compra a ideia de que os líderes em detergentes em pó irão simplesmente abrir mão, em prol do tipo líquido, da participação amealhada em muitos anos num mercado bilionário. “Será uma mudança gradativa, conforme a aceitação do consumidor”, ele condiciona.
Levantamentos setoriais apontam que o ticket do consumidor de detergente líquido supera o do usuário de sabão em pó. “Ao que parece, os fabricantes tentam convencer o consumidor ser possível uma lavagem melhor da roupa com o detergente líquido”, supõe o dirigente. “Talvez por isso as pessoas se disponham a pagar um pouco mais por ele do que pelo sabão em pó”.
Preço de venda à parte, mais de dois anos a fio de perda do poder aquisitivo, corte na carne dos postos de trabalho e remarcações não têm poupado a saída dos limpadores de roupa, sejam eles líquidos ou em pó. “O faturamento das empresas do meu ramo caiu de 20% a 30%”, lastima Perussi.
Do mirante dos líquidos, Razzo tem uma visão mais conjuntural da paisagem. “Estamos falando de produtos básicos; todo mundo precisa lavar roupas, independentemente da crise”, assinala. Sob a recessão, nota, o consumo tem migrado de artigos caros para outros mais acessíveis, abrindo boa oportunidade para fabricantes menores e gerando a experimentação de novas marcas. “Sairá beneficiado pela crise quem fabrica produtos de qualidade, pois os consumidores se manterão fiéis às marcas”, conclui Razzo. Ou seja,o sonho dos fabricantes de detergentes líquidos está pendurado no varal da retomada.
Limpeza tem cor
Os concentrados que vestem os frascos de sabões líquidos
No plano geral, o fator preço sempre deu régua e compasso ao segmento de detergentes líquidos e, em seu bojo, aqueles destinados à lavagem de roupa não são exceção. Nos últimos anos, o aumento da concorrência respingou nos frascos soprados pelo flanco dos masterbatches, enxerga José Fernandes Basílio Filho, sócio e diretor comercial da Cromaster. “O histórico mostra azuis, verdes e brancos como as cores de mais sucesso em detergentes líquidos, inclusive com o acréscimo de alguns efeitos perolados”, observa. “Mas a proliferação de novas marcas, de qualidade e preço bem distintos entre si, levou à redução de custos das embalagens e assim pigmentos de efeitos especiais, como os perolados, praticamente saíram dessa categoria de limpeza doméstica.
Em paralelo, nota o componedor, um contingente de fabricantes de detergentes tem optado por aliar a transparência do frasco de PET ao jogo de cores no rótulo e tampa. Do lado da Cromaster, Fernandes acompanha a demanda dos frascos dominantes de polietileno servindo as referidas cores tradicionais e em casos eventuais, aditivos e pigmentos para melhorar o brilho e intensidade de cor. “São solicitados quando se utiliza maior teor de reciclado na composição de materiais, o que torna as embalagens mais apagadas”, esclarece.
Limpeza líquida e certa
À margem dos coices da economia, o consumo de polietileno (PE) em frascos e flexíveis para produtos de limpeza líquidos e em pó, em particular no segmento de cuidados com as roupas, marcou pela estabilidade entre 2011 e 2015, analisa sem abrir tonelagens Albertoni Bloisi Neto, executivo de desenvolvimento de mercado da Braskem. “No mesmo período, o papel cartão reduziu seu volume em 22% no acondicionamento de formulações em pó”, ele situa. Já os produtos líquidos de limpeza doméstica, nota, estão em franco crescimento por aqui . “O aumento dessa categoria demonstra uma busca por produtos mais eficientes, práticos e inovadores, apesar do custo ainda superar o do sabão em pó”, considera Bloisi. No PowerPoint da Braskem, paira acima de 20% a taxa de crescimento dos líquidos entre 2011 e 2015, bons corpos à frente da expansão inferior a 10% flagrada para os detergentes em pó.
Polietileno de alta densidade (PEAD) é o senhor dos anéis no sopro de frascos para o setor de limpeza. “Esse segmento está bastante associado a frascos de 500 ml a 5 litros de tensoativos”, aponta Augusto Cesar Esteves, integrante da engenharia de aplicação de PE da Braskem. Essa demanda é nutrida pela empresa com quatro grades de copolímeros de alta resistência química e mecânica, em particular no tocante à fadiga sob tensão (stress cracking), dotados de rigidez apropriada e sem efeitos colaterais no aumento do peso dos recipientes.
Roberto Herrero, coordenador do laboratório de desenvolvimento de cores da Cromex, percebe três vertentes em frascos soprados para tensoativos como detergentes para limpeza de tecidos. Ele abre com a clássica embalagem de PEAD fosca e translúcida aliada a tampas coloridas. “O segmento recorre tanto às tonalidades tradicionais em limpeza doméstica, como a cores mais intensas e que conferem contraste”. Polietileno também peleja na segunda frente apontada pelo especialista: as embalagens econômicas stand up pouch. O tripé fecha com o frasco de PET. “Se for reciclado, emprega-se aditivos blue toner para corrigir a eventual tonalidade amarelada da resina recuperada”, ele detalha. Na mão oposta da percepção de José Fernandes, Herrero considera vir aumentando a procura por cores de efeitos especiais, como brilho, para frascos de produtos de limpeza doméstica. A Cromex bate ponto nesse reduto com as cores tradicionais, pigmentos de efeitos como perolado e fluorescente e auxiliares de fluxo .“Reduzem problemas de processamento para embalagens contempladas com efeitos especiais”, explica o técnico.
Reflexo condicionado por mais de dois anos de recessão, fabricantes de produtos de limpeza como detergentes retiraram as cores de seus frascos, deixando-as apenas nos líquidos, constata Mariana Moccero Botasso, assessora executiva da componedora Termocolor. “Mas já sentimos um movimento de retorno das cores aos frascos”, ela assinala.
Para frascos de detergentes líquidos, atesta Mariana, a preferência segue com os efeitos perolados e cores vivas e sólidas. “Por exemplo, azul, verde, laranja, lilás e, nas tampas, destaque para o vermelho”, ilustra a executiva. “Mas o branco também tem lugar, integrado às cores do rótulo”. Mariana acrescenta dispor em linha de todos esses tipos de masters, diferenciados pela alta dispersão e superconcentração, atalho para a economia na manufatura da embalagem.
Condições transparentes
Se a economia sair do buraco e animar o transformador a trocar de equipamento, a migração de frascos opacos de polietileno de alta densidade (PEAD) para PET transparente pode sair da discrição atual em detergentes, condiciona Theresa Moraes, gerente comercial da M&G, nº1 em PET no país. “Devido ao parque de sopro existente, este segmento é dominado com folga por PEAD e a mudança para PET transcorre com lentidão imposta desde 2014 pela conjuntura econômica”. A executiva descarta a hipótese de essa travessia de PEAD para PET em detergentes líquidos ser incentivada pelo excedente brasileiro do poliéster. “Seus preços internos seguem os asiáticos”, ela coloca, salientando a competitividade existente entre as cotações dos dois materiais. Theresa acrescenta que os frascos para detergentes não requerem grades diferenciados de PET sendo, por sinal, um dos segmentos que mais empregam a resina reciclada.
A componedora norte-americana A.Schulman forma opinião global em masters e indica para onde o vento sopra no visual de embalagens para produtos como os de limpeza doméstica. Uma referência é o cenário dos frascos para detergentes líquidos nos EUA, exemplifica Roberto Henrique Ferrari Castilho, gerente comercial de masterbatches da subsidiária brasileira da A.Schulman. “No mercado norte-americano prevalecem as cores primárias brilhantes aliadas a um toque escuro; cores escuras fluorescentes ou metalizadas; branco e amarelo dourado e dourado com vermelho ou rosa”. A seu ver, essas opções já despontam no Brasil e tendem a ampliar seu espaço em sabões líquidos a tiracolo da ansiada recuperação da economia.
“No Brasil, os concentrados de cores mais procurados para embalagens de detergentes líquidos são os brancos tonalizados e perolados”, ele elege. “Ainda em efeitos especiais, nota-se o emprego de master dourado”. Castilho informa atender as filiais no Brasil de múltis de limpeza doméstica com masters de sua empresa especificados nas matrizes europeias dessa clientela. “Estamos em processo de homologação desses masters produzidos aqui, a preço mais competitivo que os importados”, adianta o executivo.•