Nove anos atrás, a petroquímica Braskem Idesa ativava no México seu complexo de 1.050 milhão de t/a de polietileno (PE), empoleirada no etano da petrolífera estatal Pemex, suprimento tempos depois inconstante devido à carência de gás natural e de investimentos para fechar essa lacuna. Para escapar da sina da consequente ocupação insatisfatória de suas plantas, a joint venture da brasileira Braskem e o grupo local idesa, decidiu importar volumes complementares de etano dos EUA. A estratégia tomou corpo com a construção, orçada em US$ 450 milhões e iniciada em 2022, do Terminal Química Puerto México inaugurado em 7/5 último em Vera Cruz, maior porto do Golfo do México. Entre os pontos altos da obra, constam o cais específico para a finalidade, dois tanques criogênicos (50.000 m³ cada), a capacidade para bombear 80.000 barris/dia e o etanoduto de cerca de 10 km até o complexo de eteno/polietilenos de baixa (PEBD) e alta densidade (PEAD). Na entrevista a seguir, o cordão umbilical entre o empreendimento e a competitividade e perspectivas azuis da Braskem Idesa é esmiuçado por Cleantho de Paiva Leite Filho, diretor geral do TQPM.
Cleantho Leite: terminal garante etano a preço competitivo e sem restrição de volume para Braskem Idesa.
Em quanto tempo Braskem Idesa e a operadora logística holandesa Advario, controladores do TQPM, projetam o retorno do investimento de US$ 450 milhões na obra?
O contrato de serviços de armazenagem e entrega de etano entre TQPM e Braskem Idesa é de 20 anos, condições renováveis. O retorno do investimento para os acionistas é o típico de investimentos em infraestrutura, que são prazos de sete a 10 anos. Mas aqui o mais interessante é entender que o investimento no TQPM é uma garantia de acesso à matéria prima a custo mais competitivo e sem restrição de volume, o que a Braskem Idesa não tinha e precisava, pois o fornecimento de etano no México era insuficiente. Assim, ela passará a operar não mais a 75%-80% de sua capacidade e, sim, a capacidades >95%, o que traz um enorme proveito adicional, independente do benefício da Braskem Idesa como investidora no terminal em associação com a Advario.
A disponibilidade do etano americano, proporcionada pelo terminal, mantém ou dispensa a fração de etano fornecida pela Pemex?
A fração de etano fornecida pela Pemex deixará de ser um volume fixo e passará a variável, a depender de quanto ela produza e quanto não utilize em seus próprios complexos petroquímicos. Assim, esse volume poderia ser de 40.000 barris/dia (cerca de 1.900 t/dia) ou zero. Mas a Braskem Idesa estará sempre interessada em seguir com o fluxo que a Pemex possa fornecer, pois o etano local, por não precisar de logística complexa, acaba sendo mais competitivo.
“A capacidade excedente do terminal já foi contratada pela Braskem Idesa para suportar sua possível expansão”
O etano trazido dos EUA acaba com a Operação Fast Track de importações de etano de diversas origens, em vigor quanto o terminal não ficava pronto?
Sim, com a entrada em atividade regular do terminal, a partir do segundo semestre, a operação Fast Track, de etano por meio de barco-caminhão-fábrica, se tornará desnecessária e será descontinuada.
No ano passado, quais foram os volumes de etano fornecidos à Braskem Idesa pela Pemex e pela operação Fast Track?
Em 2024, o fornecimento da Pemex foi de aproximadamente 30.000 barris/dia (por volta de 1.500 t/dia) e o da operação Fast Track, algo em torno de 20.000 barris/dia (aproximadamente 1.000 t/dia).
Como avalia os efeitos sobre a superoferta e perspectiva de preços do etano americano causados pela barreira tarifária de 125% (passou a 10% na trégua de 90 dias acordada com o governo Trump a partir de 14/5) imposta pela China para gás liquefeito do petróleo GLP (matéria-prima para etano) dos EUA? E quais as vislumbradas consequências disso para a competitividade dos preços de PEBD e PEAD da Braskem Idesa?
Na realidade a importação de GLP é, em essência, para a produção de propileno/polipropileno (PP), e não eteno/polietileno (PE). Assim, essa tarifa não impacta a produção de PE´s. No caso do etano, a China isentou de tarifa de exportação (tal como era antes da guerra tarifária). Portanto, o cenário segue similar, com tarifa zero para importações de etano, não afetando a produção chinesa de PE. Assim sendo, o cenário de competitividade, se comparado com a China, não se altera. Mas as tarifas que existem agora em outras partes do mundo, como Europa e diversos países, quando recíprocas, podem alterar a atratividade de exportações da Braskem Idesa para esses destinos, aumentando em alguns casos ou diminuindo em outros – e isso está ainda por ser constatado. Como as mudanças são recentes e ainda há muita negociação ocorrendo e por ocorrer, é difícil fazer uma afirmação de mudanças mais permanentes de atratividade/rentabilidade em cada local.
Em entrevista sua ao site Icis, disse que a Braskem idesa pode rodar a 100% com suprimento de 63.000 barris/dia de etano importado dos EUA. Como o TQPM tem condições de bombeio de 80.000 barris/dia, quais os planos da Braskem Idesa para os 17.000 barris/dia que complementam o potencial de fornecimento do terminal?
Num primeiro momento, essa capacidade excedente do TQPM, não será utilizada. Mas já foi contratada pela Braskem Idesa para suportar uma possível (mas ainda não decidida) expansão de sua capacidade, que poderia ampliar em 15%-20% agora que tem a certeza de acesso à matéria-prima através do terminal. Como a Braskem idesa é um complexo petroquímico muito moderno, eficiente e de grande escala, eu acho que ela poderá ser muito competitiva mesmo nesse ambiente atual de turbulência tarifária. Portanto, conta com condições para pensar seriamente nessa expansão em curto-médio prazo.
Em 2024, o México demandou cerca de 2.5 M t de PE, das quais 20% da Braskem Idesa”
Poderia explicar mais a fundo esse acalentado plano de expansão da Braskem Idesa? Ela subiria para a faixa de quantas t/a? Há intenção de expandir a produção de PEAD e PEBD ou de inserir um trem de PEBDL no complexo?
Como já comentado, a possível ampliação seria de 15%-20%, índice que representa entre 150.000 a 200.000 t/a de capacidade adicional à atual de 1.050 milhão de t/a. Tudo indica que se poderia expandir nos trens já existentes de PEAD (750.000l t/a) e PEBD (300.000 t/a) sem necessidade de investir em nova linha de PEs. Mas, sim, um trem de PEBDL seria muito bem-vindo no mercado deficitário do México…
O mega excedente mundial de PE, o clima de incertezas gerado pelas barreiras tarifárias e a demanda mundial enfraquecida inibem ou não a eventual aprovação do investimento na ampliação da Braskem Idesa?
Eu acho que o mundo é das fábricas de grande capacidade, modernas, atualizadas tecnologicamente, com proximidade a grandes mercados e acesso à matéria-prima competitiva. Acho que a planta da Braskem Idesa atende a todas essas características e, portanto, mesmo num ambiente superofertado ela forma entre as unidades que podem sobreviver a ciclos de menor rentabilidade na indústria. Assim, a aprovação de um investimento (a ser determinado) que pode girar entre US$ 150 milhões a US$ 200 milhões para ampliar na faixa de 150-200.000 t/a em uma unidade com essa competitividade, não deveria ser difícil de ocorrer.
Quais os volumes de PEBD e PEAD consumidos pelo México em 2024? Quais as fatias no mercado interno detidas pela Braskem Idesa nos segmentos das duas resinas e, com a operação do terminal a partir de julho, como devem fechar essas participações em 2026?
No ano passado, a demanda do mercado mexicano totalizou por volta de 2.5 milhões de toneladas de PEs, das quais 1.2 milhão de toneladas couberam a PEAD, 600.000 a PEBD e 700.000 a PEBDL. Em essência, a Braskem Idesa respondeu por todas as vendas internas e exportações de PEs do México, com cerca de 500.000 toneladas comercializadas no país, correspondentes a 20% do mercado total. Ainda em 2024, o outro produtor de PE no México (Pemex) forneceu 20.000 toneladas de PEBD. O volume restante de dois milhões de toneladas foi, basicamente, importado (>95%) dos EUA e Canada.
Em 2024, a Braskem Idesa produziu e vendeu 300.000 toneladas de PEAD no México (25% de market share nesta resina) e 300.000 no mercado internacional. Em PEBD, por sua vez, a empresa comercializou no país 200.000 toneladas (30% de market share nesta resina) e remeteu 100.000 ao exterior.
Com a entrada em cena do terminal, espero que, em 2026, a BI deva aumentar sua participação no mercado local em cerca de 100.000 a 150.000 t/a e algo adicional nas exportações. Devemos lembrar que, pela competitividade e posição geográfica, a planta no México tem sempre bom acesso a diversos mercados (EUA, Europa, América Central). Portanto, o cogitado aumento de capacidade será dirigido parcialmente ao consumo local, mas também contemplará esses outros destinos onde a Braskem Idesa já tem posição regular e poderá ainda crescer.