O cenário estabilizado há décadas de polipropileno biorientado (BOPP) no Brasil foi sacudido com a aquisição da Polo Films, há sete anos sob controle do fundo privado Geribá, pela petroquímica e transformadora Innova. Sem abrir o investimento, a companhia compradora comunicou em 2/10 a transação ao mercado, interpretada no consenso do ramo como movimento conciliador de ganhos de escala com enxugamento da concorrência num filme commodity. Procurados por Plásticos em Revista, Paulo Figueiredo e Nelson Cardoso de Oliveira, sócios do Geribá, sequer deram retorno e a Innova declarou que a empresa não atende a imprensa.
Na selfie atual, a capacidade brasileira de BOPP alinha a Polo, com 78.000 t/a; Valgroup, com 12.000 t/a; Innova, com 80.000 t/a (fonte: Simpep) e Vitopel, com 94.000 t/a. Há mais de 10 anos, atestam observadores como fornecedores de extrusoras, o segmento não expande nem renova o parque fabril, abaixo do padrão internacional de competitividade em escala. Entre as singularidades notórias da cena de BOPP, a Innova é a única transformadora do filme na Zona Franca. A Valgroup, maior conglomerado de transformação de plástico do Brasil, produz o filme biorientado em Itamonte (MG) e o grosso de sua operação é para uso cativo. Por sua vez, a Vitopel, com duas plantas no Estado de São Paulo, estimava em 2023 deter 38% do mercado interno. Na Serra Gaúcha, a unidade da Polo em Montenegro roda com três linhas de extrusão da alemã Brückner que, em 2021, produziram mais de 65.000 toneladas e geraram receita de R$ 1.2 bilhão, segundo o site Ibiá. Por sua vez, o site Emis atesta que a Polo fechou 2023 com receita líquida de vendas em baixa de 22,7%.
Em colisão com a capacidade total da ordem de 264.000 t/a, levantamentos situam a produção brasileira de BOPP em 169.000 toneladas em 2019; 186.000 toneladas em 2020; 188.000 em 2021 e 196.000 em 2022. Neste mesmo exercício, o consumo doméstico do filme é projetado na praça em torno de 180.000 toneladas. O maior mercado externo do filme brasileiro é a América do Sul, região cuja capacidade da película supera a demanda e a produção é liderada com folga pelo peruano Oben Group, principal exportador de BOPP para o Brasil. A propósito, a alíquota de importação (exclusive Mercosul) do filme biorientado é de 15% enquanto a do polímero foi oficializada em 20% em 15/10. Uma corrente de analistas julga que, tendo em vista também o comportamento do preço interno de PP, o quadro favorece a importação em vez da manufatura local da película.
Para Simone de Faria, diretora da consultoria Townsend Solutions para a América Latina, faz sentido esvaziar o efetivo de competidores locais em BOPP, efeito da absorção da Polo pela Innova, negócio sob o crivo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). “Ganhar escala é uma necessidade das empresas brasileiras demonstrada nesse movimento da Innova”, ela percebe. “As adições de novas capacidades mundiais de BOPP já partem com 60.000 t/a e o maior concorrente sul-americano (nota: Oben Group) possui o dobro da capacidade brasileira, já responde por 35% do BOPP internado e manifestou vontade de colocar planta do filme aqui. No mais, Índia, China e outros países asiáticos como Indonésia hoje compõem em torno de 50% do BOPP que importamos”. Nesse contexto, ela acrescenta, enxugar o número de players para realizar sinergias é positivo. “Mas esse movimento da indústria brasileira de BOPP precisa continuar, possivelmente buscando uma internacionalização dos ativos em regiões de custos mais competitivos”.
Rogério Mani, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Flexíveis (Abief), embarca na mesma linha de raciocínio. “Considerando que, dos quatro players locais de BOPP um (Valgroup) produz para seu próprio consumo, creio ser aceitável a relação oferta x demanda dos produtores locais e da entrada do filme importado. Vale destacar ainda a importância de BOPP em flexíveis para aplicações como embalagens alimentícias e fitas adesivas”. No plano geral, pondera o dirigente, a estratégia da Innova reflete uma questão de oportunidade. “Talvez seja mais negócio ampliar escala através da compra de concorrentes”.
Mesmo com capacidade doméstica excedente, BOPP está entre os filmes mais importados pelo Brasil. Rogério Mani justifica a situação com a constante movimentação ágil do mercado. “Apesar dos solavancos, o mercado brasileiro ainda atrai importadores, pois há consumo e um grande player sul-americano busca espaço aqui. Além disso, não acho tão grande assim a capacidade excedente do filme nacional”. Simone de Faria prefere outra abordagem. “Capacidade excedente implica a noção de produção dedicada e contínua de um tipo de BOPP e o atendimento desse mercado exige diversificação do portfólio do fornecedor”. Além disso, emenda, grandes empresas precisam exportar, inclusive para gerar receita em dólar. “Daí porque não vejo sobra expressiva de capacidade no mercado interno de BOPP”.
Com a compra da planta gaúcha da Polo, a Innova ganha mais mobilidade para cobrir a picanha do mercado brasileiro de BOPP, os convertedores do Sul/Sudeste, até então assediados pela empresa a partir da sua planta no polo industrial de Manaus, a única no gênero na área incentivada. Por sinal, o presidente da Abief sustenta, com base no colchão king size de benefícios fiscais, que “qualquer investimento em novas fábricas de BOPP no Brasil só fará sentido se for na Zona Franca”. Conforme assinala Mani, o modelo operacional de BOPP gerado em Manaus é o mesmo praticado pelos produtores de películas commodities de polietileno empregadas como substrato na etapa final da conversão de filmes técnicos, realizada fora da Zona Franca, em especial no Sul/SE onde se aloja o grosso das indústrias consumidoras dessas embalagens.
Simone de Faria pressupõe que, além de estreitar a proximidade da Innova de usuários do filme, a planta em Montenegro (RS) ensejará salutar racionalização do mix de grades na manufatura.Por sua vez, ela assinala, a unidade de BOPP mantida há 12 anos pela Innova em Manaus, também embute a possibilidade de ganhos com matérias-primas internadas a menor custo pelo privilegiado porto local, um ás de ouros na manga da empresa diante da protecionista tarifa brasileira de 20% para importação de PP, oficializada em 15/10.
A Polo Films foi constituída em 1980, na roupagem de joint venture entre British American Tobacco e Hercules. Em 1995, foi vendida para a Unigel, petroquímica de poliestireno (PS) com interesses na transformação de plásticos. Em 2017, a Unigel passou a empresa ao fundo Geribá que, por sua vez, acaba de vendê-la para a Innova, outro produtor de PS com braço na transformação. “É pura coincidência e me pareceu natural que, cedo ou tarde, isso aconteceria”, pondera Rogério Mani. Simone de Faria também passa ao largo das artes do acaso nos perfis da Innova e Unigel como controladores da Polo. “O que eu vejo é uma boa oportunidade de investimento”.