As importações brasileiras de PVC viraram o primeiro semestre arredondadas em 295.000 toneladas, volume equiparável à capacidade de 300.000 t/a da Unipar, um dos dois produtores do vinil no país, e é também um sinal de que 2024 caminha para fechar com um volume de internações acima das 403.000 toneladas trazidas em 2023. Num quadro de consumo aparente (produção + importação – exportação) estacionado no patamar de 1 milhão de t/a desde 2017 e de uma produção doméstica da resina na média anual de 700.000 toneladas desde 2018, o comércio exterior é o tópico mais vibrante do balanço de 2023 (e promete seguir assim em 2024) do relatório sobre o desempenho anual do mercado interno de PVC, encomendado à consultoria MaxiQuim pelo Instituto Brasileiro do PVC – IBPVC.
O estudo evidencia que o desastre geológico em Maceió, que reduziu desde 2018 a capacidade do maior produtor do polímero no país, a Braskem, praticamente tirou o Brasil do rol dos exportadores regulares do vinil e aumentou as importações complementares a ponto de os desembarques no ano passado corresponderem a quase 55% da produção nacional da resina. Dada a falta de investimentos na lesionada oferta local de PVC, as importações equivaleram a quase 55% da produção nacional no ano passado e, desde 2016, saltam na faixa anual de 5%. Se as incertezas jurídicas e regulatórias sobre o marco do saneamento se dissiparem, a média percentual subirá, a cargo do aquecimento em tubos para infraestrutura.
Somadas as unidades da Braskem e Unipar, a capacidade nominal brasileira de PVC é de 1.009 milhão de t/a, confirma o relatório do IBPVC. Antes do abalo geológico em Alagoas afetando há seis anos a operação da Braskem, a capacidade brasileira rodava a com ocupação acima de 70%. Do fatídico 2018 em diante, foram três anos na faixa de 60% (de 2019 a 2021) e três na média de 70% (2018, 2022 e 2023). De todo modo, o padrão vigente na petroquímica internacional delimita a média de 15% como nível máximo de ociosidade para não ferir a viabilidade econômica da produção.
Seis anos atrás, quando irrompeu a calamidade pública em Maceió, o Brasil produzia 793.000 t/a do vinil. O volume caiu à casa das 600.000 entre 2019 e 2021, avançando para 722.000 em 2022 e 739.000 toneladas no ano passado, rastreia o relatório do IBPVC. Como a demanda, mesmo com baixo crescimento do PIB, há bom tempo supera a oferta da resina doméstica, as importações atingiram 291.000 toneladas em 2016; 302.000 em 2017 e 338.000 em 2018. Passaram a 410.000 em 2019 e 391.000 no pandêmico 2020, quando surtou o mercado de materiais de construção para reformas residenciais, fator influente também no pulo dos desembarques para 571.000 toneladas em 2021, com recuo para 330.000 em 2022 e recuperação fixada em 403.000 toneladas internadas no ano passado. Em 2023, as três principais origens de PVC importado foram Colômbia, e EUA e Taiwan. Os dois primeiros países seguem no rol dos maiores fornecedores internacionais de janeiro a junho último, vindo a Argentina em terceiro, representada pelas remessas da planta local da Unipar. No pano de fundo, também pesa no ímpeto das importações a competitividade em preços causada pelo excedente mundial do vinil, liderado pela sobra de capacidade da resina chinesa, excesso por sinal agravado pela crise imobiliária vigente no há três anos no país. De acordo com varredura da consultoria Chem Orbis, a China bateu recorde em suas exportações de PVC no primeiro semestre, superando a marca de 1.3 milhão de toneladas ou 17% acima do saldo no mesmo período em 2023. Quanto às importações, não passaram de 175.000 toneladas, o menor volume rastreado pela consultoria desde 2000.
Na mão oposta, com a produção doméstica basicamente mobilizada pela demanda interna, as exportações brasileiras desabaram. Nos idos de 2016, chegaram a 135.000 toneladas e, em 2017, foram remetidas 128.000. Em 2018, o fator Maceió baixou os embarques a 53.000 toneladas. Recuaram para 32.000 em 2019; 45.000 em 2020; 34.000 em 2021; 28.000 em 2022 e meras 20.000 em 2023.
Por sua vez, o consumo aparente de PVC aumentou apenas 124.000 toneladas entre 2016, quando atingiu 998.000 toneladas, e 2023, com 1.122 milhão. Pelo rastreio do relatório do IBPVC, o consumo aparente evoluiu à média anual de 1,7% de 2016 a 2023. O estudo projeta consumo aparente de 1.160 milhão de toneladas para o exercício corrente.
“Apesar da demanda estagnada, as perspectivas para PVC continuam positivas”, defende Alexandre de Castro, presidente do IBPVC
Para a cadeia do vinil, a visão da demanda fulgurante quando a economia permite segue acima das frustrações pontuais
Para o bem ou para o mal, não há no Brasil polímero mais sujeito aos humores do governo de plantão que PVC, dada a dependência do seu maior mercado, a construção civil, dos financiamentos e verbas manejados pelas políticas econômicas. Nos últimos anos, uma conjunção de entraves, desde a oferta interna insuficiente do polímero, pandemia e insegurança jurídica até o dólar, juros e inflação nas alturas, esfriou o ânimo para se investir na transformação do vinil. Esfriou mas não matou porque não há como menosprezar a potência de um setor que, com as condições propícias para abrir as asas, tem capacidade e conhecimento para zerar duas vergonhosas e crônicas lacunas brasileiras: os déficits habitacionais e do saneamento básico. Essa força embutida e a irremovível percepção do crescimento que há de vir dão alma à entrevista a seguir de Alexandre de Castro, presidente do Instituto Brasileiro do PVC (IBPVC) e diretor comercial da Unipar.
Segundo estudo do IBPVC, a demanda de PVC deste ano será, como sempre, puxada pela construção civil e infraestrutura, dois setores dependentes dos recursos do governo. O peso bem menor dos investimentos privados seria uma das explicações para a estagnação na média de 1 milhão de t/a para o consumo nacional desde 2016?
Se olharmos o cenário da cadeia do PVC, a demanda estacionada na média de 1 milhão de t/a pode se afigurar um pouco frustrante. Ao mesmo tempo, enxergamos nesse histórico alguns picos que indicam os caminhos a serem seguidos. Por exemplo, em 2021 houve o evento da pandemia, que impulsionou bastante o mercado e as pequenas obras (reformas residenciais). Já 2022 decepcionou, por causa dos juros e inflação elevados, mas tivemos crescimento em 2023. Vale lembrar que os números do estudo não acusam efeito de estoque na cadeia do vinil – não sabemos se a quantidade mencionada da demanda foi de fato transformada. Mas o que importa, na análise do quadro, é a diretriz indicativa ao longo do tempo e não num período específico. Óbvio que, quando a gente compara com o quadro macroeconômico o panorama da demanda de PVC se relaciona bastante à taxa de juros e inflação. Nos últimos meses de 2023, por sinal, presenciamos um crescimento nos lançamentos residenciais na cidade de São Paulo; uma recuperação leve, aquém dos níveis de 2022. Mas olhando para a frente, apostamos também na demanda por quilômetros de tubulações para infraestrutura e marco do saneamento e o mercado de irrigação sempre demonstra um potencial muito grande num país de rica cultura agrícola. Desse modo, apesar da frustração com a demanda estagnada desde 2016, as perspectivas para o setor permanecem positivas.
Por que o crescente excedente mundial de PVC é guiado muito mais pela petroquímica da China do que pela dos EUA, apesar do gás natural americano mais barato?
De fato, a China possui a maior capacidade instalada e demanda mundial de PVC, fatores que explicam a relevância do país como player global e assim deve continuar.
Em PVC, o foco-chave é a construção civil, enquanto na soda cáustica são os usos pulverizados. Na conjuntura atual do Brasil, soa mais rentável para um produtor da cadeia cloro-soda e produzir mais PVC que soda ou vice-versa?
Para cada tonelada de cloro gerada se produz 1.12 tonelada de soda cáustica. Ou seja, se se produz mais PVC automaticamente se produz mais soda por causa do cloro equivalente destinado à prover PVC. Não procede, portanto, essa relação de produzir mais PVC e menos soda. Algumas indústrias produtoras de cloro não fornecem PVC e focam outras aplicações e a depender da demanda em seus mercados produzirão mais ou menos cloro e, por tabela, mais ou menos soda. Por último, vale notar que, no destino final do cloro, PVC é uma das principais aplicações – pega 50% da demanda global de cloro e daí o porquê a produção mundial do vinil explica tanto sobre a correlação quantidade de soda disponível no mercado.
Como se trata de polímero de produção eletrointensiva, como vê o futuro da produção europeia de PVC, dependente de energia a preço bem acima da média internacional? A estagnação na capacidade da Europa é caminho sem volta e o continente tende a crescer como importador regular do vinil, em especial da Ásia?
Existe mesmo na Europa uma discussão interna sobre a competitividade de sua petroquímica perante as de outras regiões. A Europa é um continente que tende a estar na vanguarda em questões (tendências e normas) regulatórias. A curto prazo, não antevejo redução na capacidade europeia de PVC, mas é um ponto de atenção para o futuro. Mesmo assim, se compararmos a situação da Europa com referências como o Brasil, temos aqui custos de gás superiores aos da Europa de hoje, em crise econômica e com a guerra na Ucrânia (nota: Brasil produz PVC com eteno obtido da nafta). Desse modo, aguardamos as cenas do próximo capítulo. Por sinal, a Europa abriu investigação recente sobre prática de dumping em PVC dos EUA, o que evidencia uma busca de barreiras comerciais pela União Europeia para continua produzindo a resina.
Para os produtores brasileiros do vinil, qual estímulo existe para desenvolver mercados e aplicações se a oferta da resina doméstica já não preenche a demanda nacional e o decorrente aumento do consumo deve ser alimentado com importações?
O estímulo para os produtores brasileiros de PVC tem a ver com o baixo consumo per capita nacional e sul-americano do vinil perante países desenvolvidos, mercados de aplicações mais nobres e de maior valor agregado da resina. Elas ainda deslancharam por aqui, o que é um atrativo para empreendedores, sem falar no caminho para PVC percorrer no Brasil mostrado pelo déficit de tratamento de água e esgoto, uma demanda que deve crescer aqui embora se trate de aplicação tradicional, a cargo de tubos e conexões.
PVC segue, majoritamente, para bens duráveis, de longa vida útil. Qual o sentido, então, em se requerer desses produtos acabados as mesmas exigências de sustentabilidade (reciclagem, redesign, reúso etc) cobradas para descartáveis?
A maioria das regiões tem obtido sucesso na reciclagem de PVC. Europa e EUA devem reciclar, respectivamente quase 1 milhão de toneladas este ano. Como bem comentado na pergunta, uma das grandes forças da resina são aplicações em geral de longa vida útil; se você compra janelas, pisos, forros vinílicos, se espera que esses produtos durem bastante. É muito grande o comprometimento da cadeia do PVC em relação à questões ligadas à sustentabilidade, com avanço global na reciclagem do material nos últimos anos e assim deve continuar.
A instituição do marco do saneamento não trouxe até hoje novos entrantes na transformação de tubos para infraestrutura. A necessidade de investimentos em tubos prediais e saneamento para recuperar o Rio Grande do Sul devastado pela enchente de maio pode atrair transformadores estreantes em tubos ou é maior a probabilidade de ampliação das capacidades existentes no mercado?
Em relação à capacidade de fornecimento, principalmente no campo dos tubos de PVC para infraestrutura, ela vem crescendo nos últimos anos no Brasil e exibe um grau de ociosidade passível de cobrir a demanda assim que o marco do saneamento sair efetivamente do papel e se transformar em novas demandas. Enfim, a capacidade de transformação atual atenderá plenamente o crescimento do mercado de tubos vinílicos nos próximos anos.
Quanto ao Rio Grande do Sul, esse processo de reconstrução não é simples nem acontece da noite para o dia. Imaginamos que pode ocorrer ao longo do tempo – e não de forma pontual – um aumento da demanda de materiais de construção, inclusas reformas residenciais e obras de infraestrutura.
O Brasil importou 403.000 toneladas de PVC em 2023. A Colômbia manteve a liderança entre as origens, mas os EUA passaram do 4º lugar em 2022 para o 2º em 2023. Como explica esse desempenho para um país cujas exportações de PVC são sobretaxadas há mais de três décadas pelo Brasil?
Os EUA têm grande competitividade na produção de PVC (nota: efeito da rota do gás natural mais barato do mundo) e o comércio mundial muda conforme as regiões e medidas (nota: barreiras comerciais ) tomadas por diversos países. Por sua vez, os americanos incrementaram um pouco sua capacidade de PVC. A América do Sul é um destino natural (nota: conveniência logística) para a sobra do vinil dos EUA. Óbvio, portanto, que eles tenham de mandar um pouco mais de resina para o Brasil. Mas o principal motivo é a competitividade econômica desfrutada pela petroquímica norte-americana para remeter material excedente a outras regiões.
Em termos de demanda por segmento de processo de PVC, o de extrusão de perfis rígidos acusou em 2023 aumento recorde de 29% e a a maior queda foi registrada na injeção de rígidos com -13%. Por quais razões?
As demandas por segmento de processo variam entre si no decorrer do tempo, com mercados melhores e piores. O que importa aqui é a tendência ao longo do tempo e não o número pontual. Não há uma razão específica para o referido aumento em perfis extrusados e queda na injeção de rígidos e, aliás, volto a lembrar que o levantamento do IBPVC não abrange a medição dos estoques na transformação de um ano para o outro. Como o quadro aludem a uma diferença pequena em números absolutos, esses indicadores podem conter referência à política de estoque em determinado segmento vigente naquele ano específico.
Na proposta de reforma tributária aprovada pelos deputados, a cesta básica de materiais de construção não foi contemplada com facilidades fiscais. O IBPVC cogita fazer algo para reverter essa decisão contestada pelo comércio do setor?
Não sei responder a essa questão. O IBPVC defende que o setor tenha cada vez mais políticas de Estado em vez de políticas de governo, de modo que possam se perpetuar, desbloquear novos investimentos e proporcionar segurança jurídica para os elos da cadeia para o setor de PVC crescer e melhorar a estrutura desse país, independentemente do governo atuante.