A desgraça da enchente no Rio Grande do Sul traz à tona a necessidade de atualizar a legislação ambiental, para mantê-la em linha com uma realidade cada vez mais escoiceada pelo aquecimento global. Os EUA, em particular, avançam com rapidez nesses ajustes para apurar a quem penalizar pelos males perpretados por mudanças climáticas, decorrentes de atividades humanas, sem nada a ver com a providência divina. É este o espírito da legislação recém-aprovada no estado de Vermont, atribuindo a empresas produtoras de energia fóssil responsabilidade financeira pela produção de dióxido de carbono e suas consequências na concretização de catástrofes com DNA no desarranjo do clima, conforme relata artigo da revista Living Earth reproduzido no site Inside Climate News.
Legisladores norte-americanos, registra a matéria, demonstram a pertinência da lei de Vermont apontando as consequências das emissões de gases estufa com a devastadora inundação de Barre, capital do estado, em julho de 2023. Exposta a chuvarada equiparável à cheia sofrida pelo Rio Grande do Sul, a cidade penou com boa parte de sua região submersa semanas a fio, arcando com prejuízo bilionário em dólar.
A lei estadual aprovada denomina-se Climate Superfund Act por exigir de produtores de petróleo, gás e carvão que cubram parte dos gastos com os estragos causados pela fúria climática. A adoção de leis similares, adianta a reportagem de Living Earth, está em consideração nos estados de New York, Massachussets e Maryland. Entrevistado para a cobertura da revista, Pat Parenteau, professor da Vermont Law And Graduate School, elogia o pioneirismo da abordagem embutida na norma de Vermont para a atribuição da responsabilidade a quem colabora para ensejar desatinos do clima. “Em essência, trata-se de cobrar de quem extrai e opera energia fóssil para que contribua para os custos destinados à adaptações locais aos inevitáveis impactos das mudanças climáticas”, sintetiza o jurista. “Isso implica a proteção de empresas e escolas sob risco de inundações; implantação de soluções para prover resiliência na estrutura de várzeas vulneráveis e investimentos na conservação de pântanos e sistemas naturais sujeitos aos efeitos danosos das emissões de dióxido de carbono”. Parenteau cometa, a propósito, que se o produto de alguém gera emissões poluentes de gases estufa, está, por extensão, favorecendo o surgimento de mudanças climáticas, o que basta para o fabricante ser considerado responsável pelas avarias acarretadas pelo evento.
Pelo ordenamento processual do Climate Superfund Act, o legislador de Vermont deve exercer o encargo de dimensionar a responsabilidade de uma empresa de energia fóssil pelos prejuízos resultantes de mudanças climáticas no estado. Parenteau esclarece que o ponto de partida para a medição da participação individual e proporcional da companhia são os fatores de emissão contidos nos registros da autarquia Environmental Protection Agency (EPA). Mas, ele ressalta, a elucubração desse tipo de cálculo é complicada por uma penca de impactos em cena, como os constatados em indústrias características de Vermont, como as de esquis para neve e de fabricação de syrup (xarope em calda obtido da seiva extraída e fervida da árvore bordo). Para proporcionar uma referência menos vaga, Parenteau se atém a um exemplo: a metodologia relativa à responsabilidade financeira de um produtor de energia não renovável nos danos surgidos de uma cheia irrompida no estado por obra de mudança climática. “O legislador precisará calcular o quanto a inundação ativada por esse fenômeno aumenta os estragos aferidos nas costumeiras enchentes anuais em Vermont”. •