Concluída a mais recente rodada de expansão da sua capacidade de beneficiamento de polímeros, Jane Campos, diretora geral da Radici para a América do Sul se vê sem espaço para alojar novas máquinas e começa a avaliar as saídas para expandir o site. Em 25 anos de ativa da componedora no Brasil, o esgotamento antecipado da fábrica volta e meia ampliada em Araçariguama, a 48 km da capital paulista, passou de surpresa a rotina. Nesse ínterim, a operação brasileira do grupo italiano Radici saiu da vala comum para disputar a liderança em plásticos de engenharia, bombeada por investimentos contínuos, nacionalização incessante de formulações e a integração com o mercado global possibilitada por um conglomerado com 30 unidades de produção e vendas e, apenas no âmbito de poliamidas (PA) 6 e 6.6, sua capacidade internacional hoje ronda 200.000 t/a. Vem desse poderio, por exemplo, o embarque de primeira hora da Radici nas aplicações que brotam na mobilidade elétrica para plásticos nobres, um momento proveitoso em particular para sua ampliada planta na China, maior fabricante mundial de carros sem motor a combustão. Uma panorâmica dos 25 anos de ascensão da Radici no Brasil, desenvolvimentos marcantes e um spoiler sobre os vislumbrados espaços para PA em cargos elétricos dão tom desta entrevista de Jane Campos; Luis Baruque, gerente de marketing e desenvolvimento para o setor automotivo na América do Sul; Ricardo Silva, gerente de marketing para mercados não automotivos na América do Sul e Rodrigo Freitas, especialista em desenvolvimento de polímeros de alta performance.
Como descreveria a ascensão da Radici no Brasil nesses 25 anos?
Jane Campos – A Radici teve uma curva ascendente bastante interessante no Brasil. No começo, não foi muito fácil introduzir uma nova marca em um setor com dois players dominantes e reconhecidos. Nossa história começou a ganhar força entre 2008 e 2009. Em meio às dificuldades então geradas no plano geral pela crise financeira mundial e por uma variação cambial absurda, a Radici crescia aqui à média de 20% ao ano. O motivo foi o seu respeito pelo mercado. Por exemplo, sempre trabalhamos com dólar médio PTAX (nota: taxa do Banco Central indicadora do valor de uma moeda estrangeira perante o real) do mês anterior para nossos preços. Mantivemos essa conduta mesmo perdendo dinheiro, enquanto os concorrentes praticavam transações com base no dólar do dia. Não foi uma estratégia de caso pensado; simplesmente somos assim, prezamos o mercado e os clientes. Hoje em dia, 90% das nossas vendas destinam-se ao consumo interno e 10% ao restante da América do Sul.
Como reparte hoje suas vendas por segmentos?
Jane Campos – Nosso faturamento tem predomínio do segmento automotivo, seguido das indústrias de eletroeletrônicos e eletrodomésticos. O automotivo segue sofrendo enquanto os demais começam a deslanchar.
Quais os desenvolvimentos de produtos e aplicações que considera marcantes na trajetória de 25 anos da Radici Brasil?
Ricardo Silva – Aí vão alguns pontos altos em separado:
- Bombas para piscinas – nosso primeiro desenvolvimento para substituição de metal.
- Braços de articulação e suporte de fixação dos assentos de estádios para a Copa de 2014 – desenvolvemos um produto sob medida, de acordo com norma ABNT, com especificação antichama e estabilização a degradação aos raios UV. Fornecemos o composto para 90% dos estádios construídos e reformados para aquele Mundial. Apenas em testes de resistência às intempéries, a homologação do material consumiu dois anos. Saímos na frente da concorrência e, quando as obras nos estádios iniciaram, já tínhamos os produtos aprovados.
- Eletrodomésticos – substituição de baquelite (termofixo) por material de engenharia, uma troca até hoje geradora de receita interessante.
Quais os principais materiais do portfólio internacional da Radici agendados para estrear em breve na produção em Araçariguama?
Luis Baruque -Temos muitas perspectivas para compostos com fibra de carbono e a linha Mixloy, formada por blends de PA/ABS, PA/PE e PA/PP de alta performance em propriedades como as tribológicas, acabamento e resistências térmica e mecânica. Destacam-se também a estabilidade dimensional, processamento simplificado e baixas densidade, permeabilidade (alta barreira) e absorção de água. A linha Mixloy é indicada para autopeças internas, externas e do compartimento do motor.
O carro elétrico acaba com as muitas aplicações de PA ligadas ao motor a combustão. O que deve acontecer com os componedores brasileiros sem vínculos internacionais quando a eletrificação decolar por aqui, com materiais homologados no exterior para peças originais e com o mercado de reposição encolhendo?
Luis Baruque – A queda do consumo de PA devido ao fim do motor a combustão é um fato, mas muitas outras aplicações estruturais demandam o material. Portanto, os componedores precisam se reinventar e estar abertos a novos desenvolvimentos, blends ou cargas especiais para atender a evolução do mercado onde PA ainda terá protagonismo. Estima-se um recuo da ordem de 30% no mercado de peças de reposição com o advento do carro elétrico, pois muitos componentes deixarão de existir. Em contrapartida, surgirão aplicações inexistentes nos veículos a combustão.
Quais os principais materiais já fornecidos pela Radici para componentes da bateria e dispositivos elétricos/eletrônicos e de sistemas de carga de carros elétricos?
Luis Baruque – Estamos trabalhando em diversos componentes para o setor de mobilidade elétrica, principalmente na China e Europa. Apesar de possuirmos um vasto portfólio de polímeros, PA continua nosso carro-chefe neste novo mercado. As principais aplicações são plugues de carregadores, soquetes, componentes de bateria, espaçadores de células, passadores de cabo, placas de base, conectores etc. Como características principais dos produtos podemos citar:
- Retardância de chama (UL V0 entre 0,4 e 1,6 mm).
- Isolamento elétrico mesmo na presença de alta tensão (CTI > 600 V e, no futuro, até 1000 V).
- Necessidade de determinados componentes para garantir a blindagem eletromagnética (blindagem EMI).
- Excelente resistência mecânica e química.
- Proteção da bateria em caso de colisão.
- Resistência térmica de componentes eletrônicos de potência na presença de alta densidade de energia.
- Eficiência do sistema de gerenciamento térmico para garantir o desempenho da bateria e de outros componentes.
- Materiais “eletricamente amigáveis”.
Quais as principais novidades reveladas pela Radici na Plast Fair em Milão, no início de setembro?
Luis Baruque – Focamos na feira três temas gerais:
- Substituição de metal – Por exemplo, especialidades no braço oscilante traseiro de e-bikes, com vantagens tipo buscando redução de peso, menores custos de ferramentas e economia energética na transformação da peça.
- Sustentabilidade – Nova linha Renycle, compostos à base de aparas e resíduos pós-consumo de PA 6 e 6.6. Entre as aplicações divulgadas, constaram cadeiras de escritório e peças de carro elétrico como soquetes e plugs de carga.
- Mobilidade elétrica – Materiais destinados a aplicações em carros elétricos. Nesse ponto, o mostruário da Radici cobre desde fibras para carpetes e demais usos no habitáculo do veículo, soquetes de recarga, plugs de carga e elementos do conjunto da bateria (battery pack) que armazena energia para ativar o motor, como soquetes, espaçadores de células, molduras e tubos corrugados para o módulo de resfriamento da bateria.
Poderia dar exemplos de formulações de alta complexidade de seus compostos produzidos no Brasil e que comprovam o uso bem-sucedido de minerais especiais da Imerys?
Rodrigo Freitas – A evolução em curso na indústria de transformação cobra o desenvolvimento de compostos de alta complexidade. Por exemplo, PA6 com reforço hibrido, à base de fibra de vidro e carga mineral especial desenvolvida junto com a Imerys. Essa combinação proporciona equilíbrio entre a propriedades mecânicas e ótimos acabamento e estabilidade dimensional a peças externas de veículos.
Por quais motivos concretos a Radici mantém a preferência pela Imerys como supridora de minerais especiais para sua planta no Brasil?
Jane Campos / Rodrigo Freitas – A equipe da Imerys tem contribuído com a Radici na busca de resolução de problemas, oferecendo soluções em minerais especiais, capazes de melhorar o acabamento e a resistência mecânica dos compostos, com um time de P&D ativo, acessível e disposto. Esse atendimento dedicado e o empenho em superar dificuldades na composição das nossas especialidades são o diferencial da Imerys.
Imerys
Jogo de conjunto nos bastidores da formulação
Elton Belomi, gerente comercial da Imerys Performance Minerals, dínamo mundial em soluções minerais, tem aversão visceral à visão simplista de seu portfólio como meras cargas. “Carga tem a conotação de artifício commodity para baixar custos de uma formulação”, estabelece. “O nosso mostruário é constituído de aditivos minerais, cujos predicados vão além dos custos decepados para o componedor, pois também aprimoram a produtividade e performance final do polímero beneficiado”. Uma referência prática do conceito defendido pelo executivo é o trabalho desenvolvido há bom tempo pela Imerys nos bastidores da planta brasileira do conglomerado italiano Radici, ativo fixo da nata dos componedores de plásticos de engenharia.
Este respaldo proporcionado pela Imerys abrange tratamentos superficiais e soluções para aguçar a performance de polímeros nobres, entre eles os grades de PA 6 e 6.6 que hoje têm na Radici uma Ferrari mundial do setor. ”No plano mais recente, temos trabalhado com a Radici no desenvolvimento de retardantes de chama para PAs com combinações de minerais e diversas modalidades de acabamento”, revela o gerente comercial. “Em sinergia com aditivos convencionais, nossas soluções também apuram as propriedades reológicas e mecânicas e a redução de custos da formulação”.
A fábrica da Radici em Araçariguama, interior paulista, é usuária recorrente de talcos e caulins calcinados engenheirados para compostos de PA, destinados em especial à injeção de peças técnicas para autos e itens elétricos tipo espelhos, tomadas, conectores e botoeiras. “ As aplicações desses funcionais aditivos minerais são as mesmas, variando basicamente nas dosagens e o desempenho mecânico”, insere Belomi. No arremate. ele distingue o consumo pela operação brasileira da Radici do caulim calcinado (silicato de alumínio) Polarite 102 A e da wollastonita (silicato de cálcio) tratada superficialmente e ofertada com a marca Wollastocoat M15 10992. E. “Além disso, trabalhamos oportunidades na Radici com desenvolvimentos de produção local, como o caulim engenheirado Itasil 2115 B e o talco Itatalc 635 A”, ele completa.
Por trás do suporte prestado à Radici pela Imerys, esclarece Belomi, opera no Brasil um aparato a cargo de 11 unidades de negócio credenciadas pela ISO 9001 e com laboratórios de controle de qualidade; um centro de distribuição (para clientes diretos de produtos importados) e dois agentes autorizados. A cereja do bolo é o novo laboratório de ciência e tecnologia em Mogi das Cruzes, no interior paulista e atuante na América do Sul. “Seus recursos abreviam a resposta de análises poliméricas e instrumentos como reômetro de toque viabilizam a realização com agilidade de estudos antes repassados ao centro de tecnologia da Imerys nos EUA”, finaliza Belomi.