La Vaca Muerta y el brejo

Na oposição, podemos ser românticos. Mas uma vez no governo, é preciso fazer as contas. Esse ensinamento do realismo emana de recente decisão de pasmar, pois originária de quem menos se espera quando o assunto é racionalidade econômica: o governo de Cristina Kirchner. Sem delongas processuais, pedidos de vistas e outras artimanhas de retardamento, o Congresso argentino aprovou nos primeiros dias de novembro a Ley Galuccio.
Trata-se de marco regulatório para a área do petróleo, convencional ou não. Contempla concessões de 35 anos para prospecção e desfrute dessas reservas com a possibilidade de prorrogação por mais uma década e, quando superada, por outros 10 anos. Do quinto ano de produção em diante, os detentores das concessões terão direito a 20% das receitas e liberdade para importar com alíquota zero equipamentos necessários à atividade. A razão de ser da Ley Galuccio é tirar a Argentina do pé da lama do déficit energético mediante chuva de capital internacional em locais como a região sudeste, mais precisamente na área de Vaca Muerta, uma das maiores jazidas de xisto do planeta, contendo reservas aproximadas de 16,2 bilhões de barris de petróleo e 8,72 trilhões de m³ de gás.
O diabo mora nos detalhes. Em sua vista aérea, a lei indica que a ficha realmente caiu para o governo argentino. Ou seja, tal como aconteceu no México, ele se reconhece sem capital para voltar à autossuficiência energética, condição chave para o desenvolvimento, e para tanto caça investidores caixa alta com a isca dos atrativos embebidos na globalização e liberalismo econômico de pura cepa. Porém, ai porém, há um caso diferente, bem diz o samba de Paulinho da Viola. Além de carente de energia, a Argentina padece de déficit de confiabilidade. Em pé de guerra com os credores, o país está em default desde 30 de julho e, fora do mercado mundial, depende de reservas em moeda estrangeira para os gastos do governo. Burocracia e mudanças de regras no meio do jogo, marca registrada do ambiente local de negócios, deixam os empreendedores de pé atrás quanto à seriedade da Ley Galuccio. No mais, a cultura do mercado fechado já fez múltis desistirem da Argentina sob o argumento de não fazer sentido manter a presença num lugar onde não se pode gerar dividendos para a matriz.
Outra fratura exposta, ao fundo da Ley Galuccio, provém de uma falha de timing. A entrada em campo do marco regulatório transcorre justo num momento de deflação mundial sem término previsto  e consequente superoferta do petróleo e queda de preços, ao ponto de a cotação do tipo brent descer do patamar de US$ 80 em 13 de novembro. Além disso, sobram relatos do magnetismo exercido pelos EUA sobre investidores como petroquímicas, fruto do barateamento da energia elétrica e eteno servidos por óleo e gás extraídos do xisto e da estrutura produtiva e logística já disponível no país para essa exploração.
Pululam na mídia análises apontando muito mais semelhanças do que diferenças de gestão e pensamento entre os governos argentino e brasileiro, este também às voltas com energia elétrica insuficiente e de credibilidade minada por mandracarias contábeis e, página infeliz da nossa história, como cantou Chico Buarque, pela subtração da pátria mãe tão distraída em tenebrosas transações. É da composição “Vai Passar”. Tomara. •

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