Há controvérsias sobre quando o capital de risco, no sentido de investimento em empreendedores e inovadores, começou a pintar como força motriz no progresso da economia. De qualquer forma, há indícios de que isso aconteceu bem antes de capitalistas aprenderem a escrever a palavra startup. Como prova de vida do capitalismo de risco no século 15, Daniel Yergin, guru da área de energia, cita no livro “A Busca” o financiamento bancado pela rainha da Espanha, Isabel de Castela, para as viagens de Cristóvão Colombo. Outro exemplo, este do século 19, foi a dinheirama liberada pelo magnata J.P. Morgan para as pesquisas de Thomas Edson na área de eletricidade.
Mas a largada do capital de risco dito moderno, sustenta Yergin, transcorreu nos EUA pouco depois da Segunda Mundial (1939-1945) – e com a participação dos plásticos no pano de fundo. O pivô da história foi Georges Doriot, filho de um dos fundadores da Peugeot. Depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), ele mudou-se da França para os EUA e, por 41 anos, foi professor de produção (manufacturing) na venerada Harvard Business School. A Segunda Guerra fez de Doriot um precursor do capital de risco quando ele assumiu a diretoria de P&D da Quartermaster Corp., empresa constituída para o esforço de guerra e encarregada de identificar as necessidades não atendidas dos soldados e de supervisionar o desenvolvimento de produtos para suprí-las. Doriot cumpriu essa missão à risca participando de todos os experimentos e inovações introduzidas, desde capas de chuva e botas de combate a pacotes de comida compactada. Na esfera dos polímeros, narra Yergin, ele foi um dos protagonistas do surgimento da borracha sintética, conquista científica essencial para os EUA saírem da dependência da borracha natural do sudeste asiático, região tomada pelos inimigos japoneses. Como se não bastasse, o sobrenome Doriot inspirou a denominação Doron para uma armadura de plástico à prova de balas e vestida pelos fuzileiros navais no Teatro de Operações do Pacífico.
Ao final da guerra, Doriot voltou para Harvard e, picado pelo empreendedorismo, constituiu uma companhia pioneira no gênero, a American Research and Development (ARD). Seu objetivo era proporcionar interface entre grandes empresas com recursos para estimular inovações, mas sem a capacidade de colocá-las em prática, e acadêmicos e inventores. O modelo comercializador de tecnologias da ARD, ressalta Yergin, é visto entre as sementes do Vale do Silício.
A passagem de Doriot pela Quarte-rmaster convenceu-o de que “a guerra moderna é ciência aplicada”. A definição pode ser transposta para hoje, pois a humanidade atravessa uma guerra sanitária mundial. No campo da saúde pública, o capital de risco chove com fartura sobre uma elite de laboratórios no frenesi da corrida em busca das vacinas salvadoras.
No plano do mercado e do padrão de vida e bem-estar da sociedade ainda distante do cotidiano normal (na falta de adjetivo melhor), a indústria do plástico, mal refeita do choque inicial da pandemia, começa a sentir aquela comichão de buscar oportunidades recobertas pelo manto do corona. Tratam-se de ideias para serem encaradas a sério e dependentes apenas de um empurrão para desfrutarem aprovação geral. A reportagem de capa desta edição, sobre os efeitos do vírus e a colateral crise econômica sobre o setor de plásticos de engenharia, ilustra bem um ímpeto empreendedor digno do aval de Doriot, com diversos casos de substituição de materiais alternativos ou de aplicações fora do quadrado das indústrias automotiva e de eletroeletrônicos, os maiores e mais tradicionais campos dessas especialidades plásticas.
A história do plástico, por sinal, é constituída por desenvolvimentos que tornam a vida mais fácil e confortável, criados por uma gente empreendedora pouco chegada à zona de conforto e adepta da ciência aplicada para vencer qualquer guerra. •