Reina o consenso entre os pregadores da economia circular de que poliestireno expandido (EPS) desafina no coral verde devido à sua reciclagem custosa e complexa e por formar no rol das matérias-primas das embalagens e itens descartáveis. Há cerca de 12 anos, a brasileira Termotécnica, nº1 sul-americana na produção do material estirênico, prova a viabilidade de sua recuperação, atuando verticalizada na reciclagem de suas aparas e refugo pós-consumo. Em muitos aspectos, a polêmica em torno de EPS constitui um microcosmo da falta de conhecimentos na opinião pública sobre a real contribuição dos plásticos em geral não só para o meio ambiente mas para a melhora da qualidade de vida. Nesta entrevista, Albano Schmidt, presidente da transformadora catarinense, contemplada por sinal com constantes prêmios de sustentabilidade, percorre os flancos a descoberto do setor plástico em sua política de comunicação.
Por quais motivos o plástico não consegue reagir à ofensiva ambientalista que vem minando seu mercado e sua imagem? Como explica esta derrota?
Primeiramente, não vejo como uma derrota. O setor do plástico tem feito, ao longo dos anos, campanhas de conscientização sobre seu produto e a reciclagem. A Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) tem contribuído para disseminar a imagem positiva do material, veiculando na mídia campanhas que destacam sua reciclabilidade. As petroquímicas também entraram nessa luta para mostrar que o plástico não é o vilão. É importante destacar, também, que a maioria das empresas transformadoras de plástico é de pequeno porte e sem poder financeiro para investir fortemente numa conscientização massiva. Com as mídias sociais, que são opções de massa e mais baratas para as pequenas indústrias, estamos conseguindo reverter um pouco esse discurso negativo.
Ainda assim, deveríamos fazer mais para passar a imagem correta, merecida por um material que tanto fez pela evolução da sociedade, como exemplificam benefícios como a conservação de alimentos e medicamentos.
O que resta à cadeia do plástico para fazer daqui para a frente para evitar o aumento da piora de sua imagem perante a opinião pública?
Toda a indústria precisa fazer seu papel, seguindo corretamente a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela Lei nº 12.305/10. Ela determina o manejo adequado dos materiais pós-consumo. Em paralelo, é necessário que os setores dependentes do plástico para distribuir e acondicionar seus produtos se envolvam mais na causa. Aqui, chamo a atenção para os varejistas, um setor que poderia fazer muito em parceria com os fabricantes finais, pois possui espaços nos pontos de venda para receber de volta uma série de materiais que poderiam retornar aos fabricantes de embalagens, por exemplo. Não é somente quem produz que deve cumprir com as etapas da logística reversa, mas toda a cadeia que utiliza o plástico. É o princípio da responsabilidade compartilhada.
Por que todas as ações de conscientização ambiental sobre as virtudes e descarte correto do plástico, empreendidas há décadas pelo empresariado do setor, não só não corrigiram a desinformação da sociedade como têm sido ofuscadas e diluídas pela ofensiva ambientalista no cotidiano da mídia?
Muita informação circula sobre o plástico, mas há uma grande inversão de valores. O discurso de acabar com certos produtos ofusca o real problema que é: como esse lixo foi parar na natureza? O descarte incorreto feito em parte pela população fica esquecido na enxurrada de desinformação repassada por grandes influenciadores e setores de renome ligados ao meio ambiente. Uma explicação possível para isso: o plástico vem do petróleo, um produto cercado por mitos e inverdades. Mais de 90% do petróleo extraído é usado para a queima. O restante passa por processos industriais e é usado, por exemplo, para tintas, solventes e indústria farmacêutica. Uma pequena fração disso, apenas 4%, vai para a fabricação de plástico.
Como interpreta a relutância das indústrias de produtos finais e da grande imprensa em apontar a população como culpada pelo descarte incorreto de refugo plástico e de cobrar a penalização dos infratores, preferindo a alternativa mais cômoda de culpar o plástico pela poluição ambiental?
Não vejo relutância em apontar a população como culpada. O descarte incorreto é bastante falado e todos sabem as consequências. A função de penalizar quem pratica descarte incorreto não é das indústrias ou da mídia, mas dos órgãos reguladores. Assim como temos fiscalização e multa para fabricantes de plástico, precisamos rever estas responsabilidades também no âmbito civil. Mas o problema é muito maior do que se discute. Para um plástico parar no mar há uma cadeia de irregularidades no caminho e o descarte incorreto é apenas uma delas. As pessoas e empresas descartam incorretamente e o recolhimento, acondicionamento e tratamento são feitos de maneira errada pelas coletoras. Assim, para uma garrafa plástica descartada corretamente no lixo reciclável acabar no rio é muito fácil. Você coloca a garrafa no lixo correto e, por falta de coleta, esse recipiente de lixo fica cheio, venta, chove e, em consequência, essa garrafa entra em galerias que não são limpas e não possuem os mecanismos para evitar sua chegada à rede pluvial e pronto: a garrafa foi parar no rio. Se isso ocorrer, de nada adianta o produtor da garrafa investir em logística reversa, pois ela sequer chegou à reciclagem.
Indústrias formadoras de opinião em produtos de consumo e dependentes de embalagens plásticas se apresentam na mídia como empenhadas em abolir o material de suas embalagens e, no convívio com o setor plástico, juram que continuam parceiras na busca de soluções sustentáveis. Como vê esta postura ambivalente?
Precisamos, sim, de mais parcerias das indústrias usuárias do plástico, sejam fabricantes ou comercializadoras. Em 2007, antecipando-se à PNRS, a Termotécnica criou o Programa Reciclar EPS, procurou desenvolver parceiros, mas nem sempre conseguiu uma resposta positiva. Mesmo assim, adotou a estratégia de vincular clientes, varejistas, concorrentes, fornecedores, importadores, cooperativas e consumidores para realizar a logística reversa das embalagens pós-consumo – um modelo de economia circular posto em prática. Com o projeto definido, a empresa investiu cerca de R$ 10 milhões para instalar unidades de reciclagem em Manaus (AM), Rio Claro (SP), São José dos Pinhais (PR), Joinville (SC) e Petrolina (PE). Foi um processo longo e, em muitos aspectos, solitário. Quando todos na cadeia de produção e utilização se conscientizarem sobre suas responsabilidades conseguiremos reverter este problema.
EPS está na lista negra da economia circular, apesar de seus produtores defenderem em vão a reciclabilidade do material. Trata-se de crescente tendência mundial com respingos esperados no Brasil. Como a Termotécnica encara a perspectiva de encolhimento do seu negócio, vergado pela contínua pressão ambientalista?
Antes desta discussão precisamos alertar que muitos materiais feitos de plástico não possuem substitutos, portanto, não temos como simplesmente proibir seu uso ou repensar a produção. A grande questão é o descarte correto. Afinal, quem não descarta o plástico da forma adequada fará o mesmo com qualquer material. Ou as pessoas acreditam que a substituição do plástico resolve o problema do descarte? Ao contrário, a depender do substituto o problema pode ficar muito maior e mais crítico para o meio ambiente. Falar em substituição de material é falar em substituição de lixo, pois o problema é o descarte. Alguns produtos podem ser substituídos, mas o custo maior predomina nessas circunstâncias. Seja porque o material é mais caro ou de produção mais difícil, ou então, sua reciclagem requer mais insumos. Na grande maioria das vezes o plástico ganha em preço, em peso, facilidade e tecnologia. Se já temos esse material e ele só traz benefícios, por que eliminá-lo? O correto aqui é sabermos, todos juntos, como lidar com o material. Cada um sabendo a sua responsabilidade e desempenhando seu papel.
Toda ação impacta no meio ambiente, não temos como fugir disso. Precisamos encontrar o que acarreta menos impacto. Os processos de desenvolvimento e produção do plástico já estão instituídos, o que devemos fazer é entender o papel de cada um e tomar medidas sérias para não deixar que um discurso inconsequente e que marginaliza o material ganhe essa discussão. •