Tão perto e tão longe

A tecnologia faz brilhar os olhos dos recicladores mas o sonho emperra no desembolso
Amut: automação enfatizada na reciclagem de PET.

Escala e tecnologia caminham para separar os meninos dos homens na reciclagem de plásticos. Na selfie dessa indústria o Brasil come poeira, não por ignorância, mas por falta de financiamento para escapar do atraso dominante em seu parque de máquinas. “Recicladoras menores, obsoletas, informais e não capitalizadas estão com os dias contados”, vaticina Luiz Henrique Hartmann, dirigente da Comeplax, agente de equipamentos europeus. “Com nossos dispêndios de energia e logística, vai ficar apenas quem tiver volumes altos e custos baixos”. O diabo, já se disse, está nos detalhes.Grande parte dessa tecnologia necessária é importada. Do lado do governo, o BNDES tem nome feito na praça como bom de boca e ruim na liberação de recursos a transformadores e recicladores para a compra de máquinas, sejam nacionais ou de fora. Quanto ao capital privado, fala por si o descaso com que Itaú e Bradesco, os dois maiores bancos do país, trataram o pedido de entrevista de Plásticos em Revista.
“Apenas o Banco do Brasil tem uma linha de crédito para importações, restrita a quem já é cliente dele, compatível com as condições da Finame para a compra de equipamentos nacionais”, distingue Hartmann, sugerindo como saída reduzir a carga tributária para equipamentos importados e financiamento do BNDES para projetos relevantes de reciclagem, em sintonia com a lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Uma pedra no meio desse caminho, ele aponta, é o perfil padrão da indústria de reciclagems: uma empresa pequena, sonegadora, obsoleta e de pires na mão. “Essa fama dificulta muito o desenvolvimento do setor, caso de seus pleitos para baixar a carga de impostos sobre os reciclados, e pesa ainda para recicladoras volta e meia terem negados os pedidos para fazer seguro patrimonial”.
Em contraste, Hartmann percebe os recicladores em geral antenados na modernidade. “Na Feiplastic 2015 atendemos mais de 200 deles interessados em investir em equipamentos”, constata. “Andam apavorados com a defasagem existente e os muitos degraus a vencer para elevar a eficiência de suas empresas com as novas tecnologias”. Entre elas, o agente encaixa as automatizadas extrusoras de sua representada Starlinger. “Possuem sistemas especiais de gaseificação do material impresso e a opção do processo de filtragem a laser”, ele destaca. A propósito, Hartmann comenta que o Brasil ainda fabrica extrusoras para reciclagem com método de troca tela manual, “enquanto as linhas importadas operam com sistema a laser”, compara. Retomando o fio da Starlinger, o agente ressalta o pedrigree da nova extrusora ECO-dynamic. “Economiza energia em mais de 10% frente ao modelo anterior e admite a possibilidade de incorporar cargas numa segunda rosca opcional, tipo cascata”.
A Comeplax representa outra mão na roda para o reciclador, a tecnologia BHS (Bulk Handling Systems). “Tratam-se de sistemas integrados para extrair do resíduo sólido urbano todos os recicláveis de valor comercial, sem a necessidade de coleta seletiva precedente”, traduz o agente. O processo abre com um rasgador de sacos e separação dos orgânicos presentes. “A seguir, a triagem dos polímeros, inclusive por cores, cabe à tecnologia de separadores por densidade e aos leitores infravermelhos de alta velocidade”, ele completa.
A vanguarda também dá as caras no mostruário da representada Lindner. Hartmann comparece aqui com as linhas e plantas turn key Washtec, para lavagem e secagem de poliolefinas. Outro ponto alto: a série Lindner Resource, de robustos trituradores munidos de monorotor composto de facas tipo pastilhas. “Opera a 58 rpm e o material é pressionado numa contra-faca fixa”, esclarece o agente. Entre os diferenciais, ele cita o nível de ruído abaixo de 58 decibéis, o painel de controle automatizado e a alimentação podendo ser feita por fardos inteiros (inclusive com arames) sem exigir abertura. Hartmann também salienta o recurso do empurrador pneumático dentro da câmara, evitando colisão com operadores e zerando o risco de emissão de partículas, e os préstimos de um opcional: o limitador de torque, presente a partir do modelo de triturador Vega 1650. “Esse sistema de embreagem garante a parada da máquina caso materiais estranhos,como ferrosos, caiam no rotor”, indica o dirigente da Comeplax.
A aba de inspeção, ele percebe, faz a diferença entre esses trituradores e os tradicionais moinhos de facas. “Os operadores podem inspecionar o equipamento sem entrar neles, zerando a hipótese de acidentes existente nos moinhos, pois o operador em regra precisa subir neles para realizar a checagem”. No âmbito específico das facas, ele coloca, os modelos incorporados nos trituradores podem ser utilizados até quatro vezes, em sistema rotativo. “A vida útil de cada jogo de facas pode chegar a 3.200 horas, enquanto nos moinhos elas são trocadas, a depender do material, em períodos a partir de oito horas”, confronta Hartmann.
Oliver Venezia, diretor da Intermarketing Brasil, agente das extrusoras da austríaca Erema, confia nos mandamentos da PNRS para ajudar a equipar a contento a indústria nacional de reciclagem. No momento, concorda, prevalecem na foto do setor empresas mirradas e de pouco acesso ao crédito por serem informais em razão da carga tributária, situação cuja saída por ele defendida seria a redução de impostos sobre o material reciclado. Para complicar o enrosco, insere, “os equipamentos nacionais ou montados internamente possuem baixo nível de automação”, quadro que implica maior intervenção manual no processo e, ele emenda, risco de acidentes. À parte o mico do crédito bancário e da pedreira fiscal, separa Venezia, a decisão de investir em extrusora atualizada de reciclagem é norteada pela automação, economia de energia, produtividade e robustez da máquina. Se a negociação põe esses pesos na balança, ele garante, a venda de linhas Erema é certa. “Nossos preços FOB são compatíveis com os praticados no mercado nacional e temos apoio da Erema com linhas de crédito competitivas”, acena Venezia.
A menina dos olhos da Erema é o sistema Intarema, cujos argumentos de venda assentam-se em dois pilares. Um deles é o sistema Smart-Start. “Basta apertar um botão para a extrusora partir e atingir a produção desejada, com base em receitas pré-programadas, sem intervenção do operador” informa Venezia. O segundo ponto alto é o mecanismo Counter Current, resultante da inversão da rotação do disco do compactador. “Possibilita o processamento de uma variedade maior de materiais e a alimentação da rosca da extrusora desde o início da operação, encurtando assim o tempo para a produção atingir o pico”, sintetiza o dirigente da Intermarketing. O aumento da eficiência na alimentação da rosca, ele ressalta, também permitiu a redução dos seus diâmetros. “Antes da série Intarema, uma extrusora Erema produzia 1.300 kg/h com rosca de 160 mm de diâmetro, desempenho hoje alcançado com rosca de 140 mm”, confronta Venezia. “ Esse avanço levou à diminuição do tamanho da linha e da potência dos motores, resultando em menos kW gasto por quilo produzido”.
A triagem manual de materiais tem firma reconhecida como calcanhar de Aquiles da reciclagem brasileira de plásticos.É um nervo exposto no qual a escandinava Tomra Sorting vislumbra um mar de oportunidades para seus automatizados sistemas Autosort nadarem de braçada, embora as águas se mantenham revoltas. “É alto o grau de defasagem dos recicladores nacionais, efeito da falta de marcos legais e incentivos fiscais para impulsionar investimentos”, engrossa a cantilena Carina Arita, diretora comercial do escritório da Tomra Brasil. Em decorrência desse vácuo e da carência de financiamento para tecnologias importadas, inclusas as sem similares locais, ela constata, poucas empresas no país atingem alta pureza e propriedades em seus reciclados próximas da resinas virgem. “Daí porque a maioria dos recicladores não consegue licença para uso de seus produtos em aplicações mais nobres ou embalagens de alimentos”, amarra as pontas Carina.
Na mira dos sistemas com sensores ópticos da Tomra, estão os recicladores em dificuldades com a triagem, etapa considerada por Carina o gargalo do processo da reciclagem, pois a precisão na separação de materiais condiciona o desempenho esperado na moagem e extrusão. “Assegura maior pureza e fluidez e menor manutenção e frequência na troca de telas”, ela nota. Esse cordão de vantagens é o chamariz da quarta geração Autosort, munido do sistema Flying Beam com duoline. Além do aumento gerado na eficiência da triagem, assinala Carina, ele oferece relatórios estatísticos temporais do material analisado e seu consumo energético é cerca de 70% inferior ao do sistema Autosort da terceira geração.
“A separação óptica está se tornando obrigatória na reciclagem de alta qualidade final”, reconhece Carlos Seibt, sócio diretor da Seibt, ponta de lança nacional em instalações de reciclagem de poliolefinas e PET, esta com lavagem a quente. “Em operações de produção elevada, a separação manual se inviabiliza e onera o processo com o custo de pessoal”.
Seibt enxerga o setor de reciclagem cada vez mais inclinado a soluções completas e automatizadas, mas a o pior trava a essa disposição é acesso ao crédito e o caixa das empresas no volume morto. Em contrapartida, ele percebe mexidas para melhor naquele perfil do reciclador nacional. “Já são muitos os recicladores fora da informalidade, capitalizados e com equipamentos de ponta”, observa o dirigente, exemplificando com o nível de qualidade proporcionado aos clientes por soluções da Seibt. “Temos sistemas de reciclagem trabalhando com um ou dois operadores abastecendo a esteira de entrada”, conta. “Após a moagem, lavagem e secagem, a operação transcorre integrada com a extrusora granuladora”. Em suma, coloca, a tecnologia da Seibt requer pouca mão de obra para operar um sistema gerador de reciclados em grãos a partir de filmes ou rígidos originários da coleta seletiva. “Itens como CLP e interface IHM para controle do processo podem ser agregados aos equipamentos”, adiciona o diretor. No embalo, ele ressalta, como recente complemento da linha, o ibope estelar desfrutado por suas estações de tratamento para efluentes do processo de descontaminação de plásticos. “Com capacidades de 5,10,15 e 20 m³/h, elas permitem o reaproveitamento da água por vários ciclos”, afirma Seibt.
O interesse por equipamentos para reciclagem cresce a ponto de a Amut Wortex apostar em crescimento de 15-20% nas vendas este ano das instalações fechadas Challenger que monta em Campinas, no interior paulista. Para essa sua projeção rolar, o sócio executivo Paolo De Fillipis reconhece uma parada federal pela frente, à margem da economia na UTI. “O grande entrave é a dificuldade de financiamento da alta tecnologia a juros atraentes”, pondera. “Ela existe, mas está inacessível para pequenas indústrias e as regras atuais da Finame, estipulando entrada de 30% do valor financiado, quase impossibilitam o investimento em novas máquinas”. Além do mais, apimenta, pesa na balança a carga tributária e a escassa disponibilidade de material reciclável de alto valor agregado. “Diante disso, os fabricantes locais de equipamentos de reciclagem não conseguem investir em tecnologia por falta de demanda”. Daí as marcas visíveis do atraso na reciclagem nacional, completa o dirigente, ilustrando com mão de obra intensiva, desperdício de energia, manutenção cara e máquinas antiquadas. “Um exemplo de ineficiência, encarecimento e geração de produtos de baixa qualidade: linhas que moem, lavam e aglutinam o material flexível a ser granulado e ele ainda precisa ser reaquecido para reuso em saco de lixo”, lamenta De Fillipis. Outra cruz nas costas do setor, ele aponta, é a separação, em regra manual, de plásticos vindos da coleta seletiva. “Muito refugo recuperável acaba no aterro”, assevera. No pano de fundo, ele vê a PNRS pendurada na brocha em seus cinco anos de vida. “Por trás do apoio geral, povo e governo não fazem a sua parte na prática e a lei não é aplicada a rigor”.
No momento, a joint venture da italiana Amut com a brasileira Wortex veste dois chapéus. Atua como agente no país de equipamentos como determinadas linhas de reciclagem importadas da Amut, caso de instalações para recuperação de PET e retirada de rótulos de garrafas do poliéster, e constrói em Campinas periféricos e sistemas fechados Challenger.
De Filippis aproveita a deixa para reiterar a recente introdução nessa série de sistemas para recuperação de refugo de poliamida 6 grau têxtil e de polietileno e poliestireno expandidos. “A linha para reciclar retalhos de tecidos conta com moinho, rosca, sistema de degaseificação e compactador específicos”, ele distingue, citando peças técnicas como destino desse reciclado. No âmbito dos polímeros expandidos, De Fillipis distingue os ajustes feitos no sistema de alimentação e moagem, além da rosca repaginada para preservar as propriedades do material reciclado, de modo a voltar de imediato à linha de produção. Em ráfia, ele segue, a Wortex marcou gols recentes ao entregar duas instalações para reciclagem e ao desenvolver linha de lavagem de refugo de sacaria industrial, de defensivos e agro commodities. Na esfera de polipropileno, o hit da temporada é a instalação de lavagem e extrusão do polímero separado de baterias automotivas recicladas, capaz de operar a 1.000 kg/h, fixa De Filippis. No campo das sacadas recém-saídas do pipeline em Campinas, ele se aferra ao equipamento apto a lavar 500 kg/h de filmes pós-consumo. “Consome 40 kW/h perante a faixa de 160 a 240 aferida na tecnologias disponíveis para atingir a mesma produção e ainda acusam problemas de secagem”, compara o industrial. •

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