Sem visibilidade

Os volumes movimentados pela distribuição brasileira de resinas subiram 7% em 2014, variação até tímida na análise Laercio Gonçalves, presidente da Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas Plásticas e Afins (Adirplast) e da agente autorizada Activas. O potencial de avanço é, de fato, suculento sob o pressuposto de que revendas autônomas detêm, no momento, mais da metade do mercado total no varejo de resinas. No entanto, o percentual positivo do saldo do ano passado merece rapapés pois extraído de um período de economia de rastros, demanda em anemia e inadimplência nas alturas. O exercício atual, avinagrado pela nitroglicerina da recessão, ajustes fiscais, inflação e aumento dos impostos e preços em geral, transcorre ainda mais embaçado, suspira Gonçalves na entrevista a seguir.

Laércio gonçalves
Gonçalves: inadimplência assustadora na transformação.

PR – Qual é a sua interpretação sobre o desempenho da distribuição oficial de resinas em 2014?
Gonçalves – No ano passado, houve crescimento de aproximadamente 7% sobre os volumes de 2013, considerando os associados da Adirplast. Mas é uma expansão aquém do potencial do segmento. O volume movimentado pelos agentes oficiais em 2014 ficou entre 407.000t e 410.000t. Só que o mercado da distribuição real no Brasil chega perto de 1 milhão de t/ano, incluindo as revendas. As empresas sob o guarda-chuva da Adirplast ainda representam uma fatia pequena perto do potencial total.

PR – A participação da revenda tem aumentado ou diminuído ao longo dos anos?
Gonçalves – Aumentou muito, mesmo com a nota fiscal eletrônica. O efeito foi inverso, especialmente quando, em 2013, o ICMS para produtos importados foi unificado em 4%. Isso abriu uma janela grande para a informalidade. Muitos compram com 4% e vendem com 18% de imposto. Informalidade não é só vender sem nota, mas não recolher os impostos de forma correta, como todo contribuinte deveria fazer. Com essa mudança, houve invasão de revendas, de importadores autônomos de fora do segmento de plásticos, bem como de alguns grandes transformadores que já utilizavam produtos importados e começaram a importar mais para revender. No Brasil, cerca de 20% do mercado comportariam revendas, para, inclusive, atender aos clientes muito pequenos ou com balanço complicado, nicho no qual os agentes oficiais não chegam. Porém, essa revenda às vezes vai até para cima dos clientes da petroquímica.

PR – Dólar acima de R$ 3 deve ou não refrear a penetração de polietileno (PE) e polipropileno (PP) importados no varejo do plástico, levando-se em consideração que as resinas estão com preço em baixa lá fora?
Gonçalves – Esperávamos um primeiro semestre com queda de preço. Mas o barril de petróleo se estabilizou entre US$ 55 e US$ 60 e muitas petroquímicas pararam as atividades momentaneamente para ver como o mercado ficaria. A Platts já está anunciando aumento de preços internacionais. Tenho falado com importadores que estão com dificuldade de encontrar produto. PP, de vários tipos, tem mais restrições. Ao longo de janeiro último, havia uma expectativa em torno de preços mais baixos de petróleo e real estabilizado ante o dólar, porém o cenário mudou completamente. O preço do barril se estabilizou e o preço internacional de resina (PE), que bateu  em US$ 1.600 a US$ 1.700 por tonelada, está na órbita de US$ 1.100 com tendência de alta. Como o Brasil é muito dependente de nafta e o dólar está se valorizando cada vez mais, veremos aumentos em abril. Foi sinalizado pelas petroquímicas que teremos então um aumento expressivo de cerca de 10%.

PR – É possível repassar esse aumento em um mercado tão recessivo?
Gonçalves – Já houve queda interna de preços, mas eles devem agora retornar aos patamares de novembro último. Não temos como absorver o custo desse dólar alto. Trabalhamos em cadeia. Pode ser que os transformadores comprem menos, porém não podemos vender com prejuízo. É preciso passar uma parte do reajuste nos preços para frente ainda que os volumes diminuam. É um momento econômico difícil, o dinheiro anda caro no país e os bancos estão restritivos para concessão de crédito a novos clientes. O grau de risco de inadimplência é alto. O aumento de preço não é para melhorar margens, mas para sobrevivência. A regra das commodities é essa.

PR – E como avalia o descolamento dos preços brasileiros de resinas dos internacionais?
Gonçalves – Existe o Custo Brasil. Aqui sempre houve uma margem de trabalho diferente em comparação ao importado. Não vejo agora descolamento do preço internacional. Há um tempo de reação necessário para o mercado interno. A resina no Brasil é mais cara porque temos custos mais altos. Mas a política reajuste de resinas é muito parecida com as tendências internacionais. No ano passado tivemos aumentos e quedas em linha com o mercado mundial.

PR – Por vezes, em tempos de crise, transformadores mais capitalizados, em lugar de expandir e melhorar a produção, investiram na revenda de resina. Esse movimento tende agora a aumentar?
Gonçalves – Não. Vejo o cenário atual diferente do que já aconteceu no Brasil. Hoje o cerco fiscal é maior. Essas empresas têm grande porte e visibilidade. Era um escape para o transformador gerar negócio. Agora, com o mercado como está, com dificuldades financeiras, inadimplência alta, risco alto e tendências de diminuição no número de transformadores, um empresário cujo negócio é produzir precisa focar em sua atividade principal. É claro que não são 100%, sempre há alguns desvios. A própria distribuição tem dificuldades. Temos equipes para analisar crédito e grau de risco e verificar balanços, pois as margens são pequenas. Há pouco tempo, por sinal, um distribuidor de PP importado anunciou sua saída do negócio e disse não voltar enquanto as condições do mercado não melhorarem. O problema do Brasil não deve ser atribuído à crise de 2015. As dificuldades vêm de muito antes.

PR – Não é o momento, então, de o distribuidor diversificar seu portfólio e depender menos de vendas de resinas?
Gonçalves – Isso vai da mentalidade de cada empresário. Na Adirplast, temos distribuidores mais conservadores, que vendem apenas resinas, e há outros com negócios diversificados. A associação também agrupa empresas que comercializam BOPP e BOPET.

PR – Quem tem portfólio mais diversificado, tem mais chance de sucesso em fases de crise?
Gonçalves – Depende da gestão. A empresa pode vender um só produto ou vários e ser bem-sucedida.

PR – Todos dizem que têm boa gestão.
Gonçalves – Não concordo. Há tipos de gestão diferentes no setor. Qualquer negócio é difícil, mas não acho que este seja o momento de se aventurar. Alguns distribuidores dentro da Adirplast podem até encerrar suas atividades devido à conjuntura econômica, mas não devem quebrar por problemas de gestão.

PR – Nesse contexto, há tendência de consolidação no número de distribuidores por meio de fusões e aquisições?
Gonçalves – Não enxergo esse tipo de oportunidade e, da mesma forma, não vejo possibilidade de agentes de fora interessados em aquisição de empresas no Brasil. Há três ou quatro anos, éramos vitrine do mercado mundial. Várias empresas foram assediadas e com ofertas muito tentadoras. Algumas empresas internacionais entraram no país, como a norte-americana PolyOne. Ela ficou dois anos no mercado, não se adaptou, e acabou encerrando quase todas as atividades no Brasil. Ficou só em masterbatches, caso dos líquidos. O risco está muito alto e não só em nosso setor. Qualquer empresa de fora pensaria duas vezes antes de adquirir um negócio no país nesse momento.

PR – Há hoje algum tipo de matéria-prima em falta no mercado local, fazendo distribuidores e transformadores recorrerem a produto importado?
Gonçalves – Na nossa linha não. Aquisição de fora é por oportunidade de preço.

PR – O momento atual é difícil para plásticos de engenharia, principalmente pela queda de produção e vendas da indústria automobilística. Quais as suas projeções para essas especialidades?
Gonçalves – Houve dois fatores que prejudicaram muito os volumes dos plásticos de engenharia e sua distribuição. Primeiramente, alguns novos distribuidores não encontraram espaço para comercializar commodities. O setor estava saturado nos redutos de PE, PP e poliestireno (PS). Assim, revendas iniciaram atividades com plásticos de engenharia. Isso destruiu margens e prejudicou distribuidores consolidados. Num segundo momento, emergiu essa crise que afetou a fabricação de autopeças. A própria Unigel encerrou a produção de policarbonato (PC). Mas isso tem acontecido de alguns anos para cá. Entre os associados da Adirplast, o giro de plásticos de engenharia chegou a bater 2500 t/mês. Hoje estamos em 900 t/mês.

PR – E daqui para frente?
Gonçalves – O governo sempre fez de tudo para impulsionar a produção de automóveis e de eletrodomésticos. Contudo, agora não há crédito disponível e não vejo como virar esse jogo de uma hora para outra. O projeto da Styrolution com a Braskem, para gerar 100.000 t/a de ABS, só seria vantajoso se produzisse para exportar. O consumo doméstico de ABS ronda 80.000 t/a e uma planta para suprir só o Brasil não se pagaria. Minha empresa comercializa um copoliéster da norte-ameriana Eastman, com acabamento que imita vidro e muito interessante, principalmente para embalagens e peças decorativas. Mas no Brasil tudo esbarra no preço. Esses desenvolvimentos, quando chegam no argumento comercial, travam por aqui devido ao valor de venda.

PR – O Brasil tem oferta insuficiente para suprir a demanda por PVC. Por que não comercializar PVC de fora?
Gonçalves – É uma oportunidade a ser analisada, mas talvez pelo porte dos transformadores seja mais vantajoso importar direto.

PR – Como avalia o impacto da crise hídrica no setor?
Gonçalves – Está nos custos de água e de energia elétrica.

PR – E como repassar esses custos à cadeia?
Gonçalves – É uma equação difícil de resolver. Haverá um enxugamento de empresas na transformação. Clientes que nunca tiveram problemas com pagamentos têm atrasado ou pedido prorrogação. Falta crédito para capital de giro e a taxa de ocupação nas fábricas está baixa. Mas nossos clientes estão passando por dificuldades devido à conjuntura geral e não por conta da crise hídrica no Sudeste.

PR – Perdurando esse problema de falta de água, não acredita que clientes possam remanejar a produção para outras regiões?
Gonçalves – Os associados da Adirplast atuam no Brasil inteiro e 50% do volume vendido fica em São Paulo. É um polo muito forte, junto com outros estados do Sul. Não tem para onde migrar. Não há como ir para o Acre, onde está chovendo muito. Essa nuvem do petrolão está maquiando um pouco a questão da água.

PR – E a guerra fiscal? Como está a situação hoje?
Gonçalves – Não acredito que uma reforma tributária aconteça em curto prazo. É um tema muito complexo e cada estado enxerga suas próprias necessidades. Porém houve reformas internas. Hoje, São Paulo é o único estado onde o ICMS é de 18% internamente. São Paulo está perdendo arrecadação por sonegação e porque empresas estão saindo do Estado. Existe um foco muito grande de revendas em São Paulo. Havia uma discussão para implantar ICMS de 12% e, assim, quando a mercadoria entrasse no Estado com 12%, a empresa também precisaria vender com a mesma alíquota. Por isso não haveria ganho sobre o ICMS. Contudo, quando a mercadoria entra com 12% e é vendida com 18%do imposto, a empresa já ganha 6% na operação nessas condições básicas . Se a redução do ICMS vingar, será um tiro na cabeça da revenda que sonega. Já em Santa Catarina ou Paraná há importação. Em São Paulo muitos entram no negócio para se aproveitarem dos impostos. Mapeamos no ano passado e São Paulo possuía 150 revendas, com empresas movimentando de 500 kg a 5 t/mês.

PR – E quais são os próximos passos?
Gonçalves – Vemos no noticiário que os governos estaduais e federal estão arrecadando menos. Antes batiam recordes. Como as empresas não estão bem, cria-se um ambiente para sonegação forte. Empresas vão primeiro pagar suas dívidas para continuar operando antes de pagar seus impostos. Uma reforma completa seria muito complexa e mexeria com muitos interesses diferentes. É algo difícil.

PR – Qual o impacto da inadimplência na carteira da distribuição em 2014 e qual a previsão para este ano?
Gonçalves – A inadimplência está em níveis assustadores em transformadores de todos os portes. A Activas tem sofrido com isso e algumas empresas nos pegaram de surpresa pedindo recuperação judicial. O departamento financeiro dos clientes está sendo monitorado como se fosse uma UTI. A ideia é ter o máximo de informações possíveis de uma empresa para conceder crédito. Nossos fornecedores, devido aos juros altos, diminuíram nossos prazos para pagamento. Há, portanto, uma tendência de que a distribuição, da mesma forma, reduza os prazos concedidos aos clientes e, com isso, diminua seus riscos. A maioria dos clientes da distribuição tem grandes chances de dar calote. São empresas que não têm uma boa gestão.

PR – Muitos desses transformadores são volta e meia alertados por meio mundo para os riscos de sua gestão familiar, rudimentar e deficiente.  Por que não reagem e se mexem para profissionalizar suas empresas?
Gonçalves – Boa pergunta. Na distribuição, de forma geral, há boa gestão. Mas não sei explicar porque o mesmo não acontece na transformação. Há excesso de transformadores no Brasil para o tamanho do mercado.

Fé cega e faca amolada em 2015

Os distribuidores de resinas encaram 2015 como uma prova dos nove. Contra tudo e contra todos os sinais de uma economia no chão, o setor não faz por menos: prevê aumento de 9% em receita e volume no acumulado até dezembro versus 2014, capta levantamento da consultoria MaxiQuim encomendado pela Associação Brasileira dos Distribuidores de Resinas Plásticas e Afins (Adirplast).
Poliolefinas são a jugular do varejo do plástico. No pente fino em mãos da Adirplast, a demanda doméstica de polietilenos (PE) caiu 3,7% no quarto trimestre de 2014 perante o mesmo período um ano antes. Em volume, murchou de 641.000 para 618.000 toneladas. O clima de barata voa aflorou no recuo de polipropileno (PP) com queda de 4% no mesmo confronto – de 383.000 para 368.000 toneladas. Noves-fora, a demanda brasileira de poliolefinas encolheu 3,8% considerado o trimestre final de 2014 com o de 2013. O ano passado também marcou, aferiu a pesquisa, pela engorda das importações na demanda doméstica de PP e PE, da ordem de 33,8% e 20,3%, respectivamente, em relação a 31,3% e 18,4% no cômputo de 2013. Em volumes, conforme os sensores oficiais, foram desembarcadas 871.000 toneladas de PE e 307.000 de PP  em 2014.
Pelo flanco dos canais comerciais de poliolefinas, a venda direta, pela Braskem, único produtor de ambos os termoplásticos no país, declinou na demanda doméstica da participação de 67,5% em 2013 para 64,2% no ano passado.  Na mesma relação, o naco das importações subiu de 24,8% a 27,5% e o quinhão da distribuição moveu-se bem de leve – de 7,7% em 2013 para 8,3% no último período, retrocedendo assim ao patamar ocupado em 2012. À guisa de referência, no memorável 2010, a fração detida pelos distribuidores de poliolefinas fulgia em 12,5%.
Acomodadas as poliolefinas e resinas de engenharia no mesmo bojo no estudo da MaxiQuim, o volume de termoplásticos vendido por agentes oficiais saltou 7,4% em 2014, conforme atestam as 380.000 toneladas faturadas em 2013 contra 408.000 a seguir. Ainda assim, o indicador do ano passado só perde para o de 2013 como o pior desempenho da distribuição desde os idos de 2007 rastreados pelo levantamento. No cotejo de volumes distribuídos entre 2014 e 2013, as poliolefinas acusaram subida de 6,6%; poliestireno (PS), de 22,9%; PVC, de 209,3% e, na mão oposta, plásticos nobres (vendas totais de 30.485 toneladas pela distribuição em 2014)  recuaram 3,5%. No plano geográfico, o Sudeste, região hoje com a cruz da crise hídrica nas costas, respondeu por 61,8% das 408.000 toneladas comercializadas pela distribuição no ano passado, aferiu a MaxiQuim, estimando o faturamento dos agentes autorizados no mesmo exercício em R$ 2.807 bi ou 17,3% acima da receita de 2013.
No nada memorável ano passado, apontou a radiografia encomendada pela Adirplast, a fatia  (10,8%) detida pelas importações no mercado onde atuam os distribuidores oficiais foi a segunda pior alcançada desde 2009. Na esfera das poliolefinas, detalhou o estudo, o mesmo quinhão da resina importada recuou de 11,2% em 2013 para 8,9% no último período.

 

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