O alerta está na tela

Seminário fez o check up da transformação e aponta risco se ela não entrar em forma

Se a indústria do plástico não abrir os olhos, caminhará de braços abertos para a insignificância, não só por sua culpa e pelo Risco Brasil, mas acuada em tecnologia e viabilidade econômica pela concorrência internacional. Essa ameaça deu as cartas, às claras ou nas entrelinhas, conforme o tom do expositor, de ponta a ponta no temário do VI Seminário Competitividade/1º Congresso Internacional do Plástico, realizado por Plásticos em Revista e a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) em 22 e 23 de setembro último em São Paulo.

José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Abiplast, demostrou essa espada sobre a cabeça do setor em suas digressões sobre a conjuntura brasileira e seu efeito dominó sobre a indústria do país, no plano geral. Conforme assinalou, o triênio 2014-2016 foi o pior para o Brasil em mais de um século, cortesia do descontrole fiscal aliado a uma carga tributária no limite máximo.  Na esfera dos gastos públicos, especificou, 90% das despesas do governo federal são obrigatórias. Elas foram responsáveis, entre 2001 e 2015, pelo aumento fixado em 81% nas despesas totais do governo. Se nada for feito para estancar a sangria, Roriz antevê taxa de 17% para o desemprego, taxa básica de juros reais de 10% ao ano e dívida pública bruta de 167% do PIB. Daí a premência necessária à aprovação das reformas fiscais aviadas pelo governo e mantidas em fogo brando no Legislativo, casos da Previdência e do estabelecimento de teto para gastos oficiais, assim como a execução de cortes nas despesas discricionárias, do funcionalismo e outros gastos obrigatórios, concluiu o dirigente.

O espólio deixado por Lula e Dilma desembocou no Custo Brasil e desalinhamento cambial, pondo em linha de abate da indústria brasileira, apontou Roriz, a ponto de sua  participação no PIB igualar hoje o patamar ocupado nos anos 1940. Para o setor escapar dessa camisa de força, condicionou o dirigente, é preciso que os governantes de plantão encarem política industrial como política de Estado. Afinal, ele justificou, a indústria responde por 30% do investimento produtivo privado, responde pela maior massa salarial e o maior número de empregos acima de cinco salários mínimos.

Excedente global de PE  
Fernando Musa, presidente da Braskem, centrou sua exposição num zoom pelo mercado global das resinas produzidas pelo grupo, PVC, polietileno (PE) e polipropileno (PP). No plano da primeira geração, Musa enxerga recuperação gradual do preço do petróleo. A nafta superofertada, ponderou, vem mantendo o desconto frente ao preço do barril. Nos EUA, assinalou Musa, prevalece o baixo custo de energia, o contínuo aumento da produção de gás natural e a partida a curto prazo de novos crackers de etano e a implantação de mais terminais de exportação.

Na raia de PE, Musa dimensionou o consumo global em 88 milhões de t/a e assinalou que EUA e Oriente Médio hoje atendem ao crescimento da demanda asiática e confirmou as generalizadas previsões de excedente norte-americano da poliolefina, a reboque da maior disponobilidade local de etano. Em PP, ele calculou o mercado global em 63 milhões de t/a e frisou a ausência atual de projetos de expansão da capacidade da resina no planeta. Por fim, Musa arredondou em 40 milhões de t/a o mercado mundial de PVC e afiançou que o equilíbrio entre oferta e demanda tende a melhorar.

Em debate a seguir, Musa negou que o Brasil seja um mercado fechado, na contramão de todos os palestrantes seguintes que, na abordagem desse ponto, criticaram o protecionismo brasileiro. Quanto à competitividade da Braskem para duelar no Brasil com o mega excedente de PE via gás a ser remetido dos EUA a partir de 2018, ele reconheceu o peso da encrenca e confirmou o intento de importar eteno dos EUA para alimentar com custos mais competitivos uma fração da sua produção de PE na Bahia. Em relação às avarias de mais de dois anos de recessão nas costas da transformação nacional, Musa afirmou, como prova de oportunidades subjacentes no cenário adverso, saber de clientes da Braskem que estariam crescendo a taxas de 10-15% ao ano, mas esquivou-se de identificá-los.

O consumidor mudou
As  mudanças nos hábitos de consumo de alimentos e seus respingos sobre as embalagens foram o prato de resistência da apresentação de Luiz Henrique Duarte, diretor de marketing e novos negócios no Brasil da Bemis, rolo compressor norte-americano em flexíveis e recipientes rígidos e semi-rígidos. Entre as mexidas comportamentais,  Duarte chamou a atenção para o fato de, hoje em dia, ambos os cônjuges efetuarem compras de alimentos com regularidade. Quanto às crianças, distinguiu, cresce sua voz ativa nas decisões de compras familiares. Além disso, Duarte assinalou que mais de 50% das compras “para viagem” envolvem idas a duas lojas ou mais e 71% dos consumidores, pelas pesquisas estudadas pela Bemis, visitam de cinco canais de varejo de alimentos em diante ao menos uma vez por mês.

Duarte mostrou ainda pesquisas atestando que 54% dos brasileiros acham mais saudável cozinhar em casa, 30% comeriam de modo mais saudável se o preparo fosse mais simples, 47% dos respondentes preferem alimentos integrais e 6% produtos com baixo teor de sódio. No plano das macrotendências, o expositor discorreu sobre envelhecimento da população mundial e abordou as diferenças entre os hábitos de consumo  da geração Y e as precedentes, a exemplo da preferência por comer forra de casa e gastar menos no supermercado.

Ao tacar todos esses ingredientes na frigideira das ruminações, Duarte fisgou várias tendências em curso em embalagens de alimentos. Entre elas, destacou a influência do consumo em movimento (on the go), os apelos da sustentabilidade e saudabilidade, o culto ao exclusivismo e o preparo e consumo direto da embalagem.

Receita de uma transição
Um dos pontos altos do seminário foi a palestra de Manoel Flores, diretor superintendente da Astra, no papel de uma ave rara na atualidade: o industrial que não para de investir, faça sol ou chuva na economia, pois, como ele afirmou, depois das crises o mercado brasileiro sempre cresce. Daí por sinal, o lema incorporado  por ele à atividade da sua empresa e à sua visão do futuro do país, condensado numa soma: persistência + esperança.

Flores transpirou transparência de fio a pavio em sua exposição. Com 60 anos de estrada, receita de R$ 535,9 milhões, mix de 5.300 itens e 35.300 clientes ativos, a Astra se impõe nos mercados da construção, acabamento e decoração, sendo líder em produtos como assentos sanitários e banheiras de hidromassagem. Seu complexo sede em Jundiaí, interior paulista, operam com 1.000 moldes e 150 máquinas, entre injetoras, sopradoras e extrusoras, descreveu o dirigente.

Fiel à filosofia de evoluir para seguir competitivo, Flores relatou a praxe de investir todo ano R$ 10 milhões em seu parque industrial e R$ 22 milhões em marketing, inclusa a constante lapidação do corpo de 500 vendedores. Mediante essa estratégia, arrematou, a Astra tem sido bem sucedida na sua transição de uma empresa industrial para uma empresa de marca.

Medida extrema
Apanhadas no fogo cruzado da falta de crédito e vendas,  empresas descapitalizadas e inadimplentes têm buscado em massa refúgio no Poder Judiciário. Pelo indicador Serasa Experian, 1.235 pedidos de recuperação judicial foram aferidos de janeiro a agosto último, o maior número registrado nesse período de 2006, quando entrou em vigor a Nova Lei de Falências. Motivo de sobra, portanto, para o Vi Seminário de Competitividade  debruçar-se sobre os desafios para uma indústria sobreviver sob recuperação judicial. Sumidade no tema e sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados, Luis Fernando Valente de Paiva sintetizou o drama ao abrir sua palestra definindo a recuperação judicial como o Plano Z, a última opção a ser feita por um devedor, tamanho o stress, despesas e sacrifícios gerados.

Em sua exposição, Paiva perpassou pelos conceitos, objetivos, especificidades, condições para deferimento e procedimentos envolvidos para uma indústria economicamente viável em duas modalidades de recuperação: judicial e, caminho mais ameno, extrajudicial. Entre as revelações pouco conhecidas do público, ele afirmou a possibilidade de uma indústria em recuperação judicial vender uma filial, mas sem incluir no bojo da transação o repasse de dívidas e encargos pendentes como os trabalhistas.

A imagem de sempre
Na seara ambiental, duas palestras roubaram a cena. Numa delas. O professor Laércio Kutianski Romeiro,da consultoria Ciclo Ambiental, discorreu sobre o desenvolvimento sustentável, precificação do carbono e a funcionalidade da indústria plástica, esta ilustrada por avaliações de artefatos como filmes multicamada.  Por seu turno, Irineu Bueno Barbosa, sócio da Global PET Reciclagem,  focalizou as complexidades, processamento e desafios para PET bottle to bottle no Brasil, desde clientes que se proclamam ambientalistas mas só compram reciclado quando o preço lhes convém até os estorvos provocados pela guerra fiscal e incentivos tributários às importações de poliéster reciclado.

Barbosa também apresentou as ações de engajamento de sua empresa na sustentabilidade, com apoio à coleta seletiva e educação ambiental. Esses tópicos também afloraram na palestra ministrada por Carolina Arantes e Bruno Pompeu, especialistas do Ibope, sobre sua recente pesquisa a respeito a imagem do plástico no país. O levantamento confirmou o que disse um exército de estudos precedentes. Em suma, atestou a crônica imagem pública a desejar de um material com tantas virtudes. Pela análise do Ibope, o plástico ainda é visto no Brasil como pouco saudável e gerador de lixo e com alta desinformação sobre seu relacionamento com o meio ambiente e sua história, ciclo de vida e benefícios proporcionados, bastante ressaltados por Caroline e Abreu na palestra. A propósito, a organização do seminário convidou cinco publicitários de primeira linha para  comentar a linha de comunicação do setor e as razões da reputação insatisfatória do plástico. Todos eles recusaram o convite.

Novas oportunidades
Três professores universitários evidenciaram, em suas palestras, o risco que os transformadores nacionais começam a correr caso continuem alheios à nova manufatura industrial. Hugo Ferreira Braga Tadeu, da Fundação Dom Cabral; Renato da Fonseca, do staff da Confederação nacional da Indústria (CNI) e Glauco Arbix, ex- presidente da estatal Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) foram direto ao ponto. O Brasil jaz na fileira do fundo nos rankings globais de competitividade e qualificação de mão de obra. Foi apanhado de guarda pela erupção de uma nova base de manufatura que pode mudar o perfil da economia global: a Indústria 4.0, na garupa de máquinas e produtos capazes de se comunicar e controles de produção e processos descentralizados e organizados por sistemas inteligentes.

Segundo Arbix, esse conceito põe em xeque qualquer estrutura produtiva existente, em especial as mais atrasadas. “O problema é que o futuro pode estar mais  próximo do que parece”, advertiu, instando o setor plástico a acordar logo para a tendência. Arbix julga que, nesse cenário, o futuro não é necessariamente sombrio para países como o Brasil, pois a Indústria 4.0 abre novas oportunidades para as empresas. “Mas o Brasil precisa de uma indústria diferente para ganhar produtividade e competitividade, que seja capaz  de inovar, acelerar, saltar etapas, absorver e gerar tecnologia”, ele condicionou. •

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