PP avança em silêncio

Composto com DNA ambiental corteja deslocar PA da capa antirruído de motor

motorEm contraste com décadas de reaproveitamento de componentes metálicos, a reciclagem de autopeças plásticas ainda está na infância, por razões como custos e propriedades dos materiais, além de tecnologias exigidas para sua recuperação, atribui a nova edição do relatório bienal “Plastics Market Watch – Automotive”, coassinado pela norte-americana Society of the Plastics Industry (SPI). O estudo assinala ainda o compromisso das montadoras em contribuir para reduzir o refugo no meio ambiente e agregar plástico reciclado a novos carros. Impregnada por estes fluidos da sustentabilidade, Kelly Cristina Lixandrão, doutoranda pela Universidade Federal do ABC (UFABC), flagrou um espaço abaixo do capô para botar em prática o espírito da coisa: a capa de isolamento acústico do motor. A proposta de Kelly é acenar ao setor com a injeção desta peça, aplicação cativa de poliamida (PA), com polipropileno (PP) carregado com pó de refugo de pneu inservível. Além do custo em conta e da auréola verde do composto, o chamariz da estimada redução de 50% no peso da capa frente aos contratipos disponíveis na praça já renderam a Kelly uma palestra sobre o desenvolvimento, proferida para a nata dos especialistas reunidos pelo braço brasileiro da entidade Society of Automotive Engineers. Nesta entrevista, a pesquisadora detalha sua criação.

Kelly: material fácil de processar, de menor custo e baixa densidade.
Kelly: material fácil de processar, de menor custo e baixa densidade.

PR – Qual a sua fonte de inspiração para esse desenvolvimento?
Kelly Cristina – A inspiração surgiu da necessidade de buscar alternativas para os produtos de série já existentes e da necessidade de destinar de forma adequada os pneus inservíveis, gerando um ciclo produtivo ambientalmente viável. Este projeto surgiu de parceria entre a Universidade Federal do ABC e a Mercedes-Benz do Brasil, a partir do Doutorado Acadêmico Industria (DAI). Trata-se de um projeto piloto, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e que visa maior interação entre a universidade e a indústria.

PR – Capa de isolamento acústico de motor é um reduto tradicional de composto de poliamida (PA) 6 ou 6.6. Por quais motivos preferiu polipropileno (PP) em lugar de PA para formular o composto?
Kelly Cristina – O polímero utilizado foi PP isotático misturado com PP reciclado. Os principais motivos que levaram a sua utilização foram baixo custo, por ser uma commodity, baixa densidade e facilidade de processamento. A extrusão desses materiais com a utilização de compatibilizante favoreceu a produção do composto, contendo o pó de pneu como fase dispersa.

PR – Quais as características técnicas proporcionadas pelo pó de pneu ao composto de PP?
Kelly Cristina – O pó de pneu, 20% em massa, proporcionou aumento significativo na tenacidade da matriz polimérica, além de bons resultados de resistência na tração e deformação até a ruptura. O uso de métodos termoanálíticos, em função dos constituintes do material, mostrou que o composto possui boa estabilidade térmica e sua degradação começou ocorrer por volta de 300°C. Portanto, seu emprego na área do motor comprovou-se viável. Foi também possível verificar bons resultados no teste de perda de transmissão, favorecendo a aplicação do composto no encapsulamento do motor.

PR – Como avalia as possibilidades concretas de seu composto de PP com pó de pneu ser especificado originalmente para o isolamento acústico do motor de um veículo?
Kelly Cristina – As possibilidades são favoráveis, visto que os resultados obtidos no teste de ruído externo apresentaram-se similares ao produto de linha e dentro do limite especificado pela legislação.

PR – A crise acentuou a obsessão pela redução de custos nas montadoras. Pela sua estimativa, qual a diferença entre o custo do seu composto e o composto tradicional de PA para a capa do motor?
Kelly Cristina – A estimativa é de que o custo do encapsulamento com composto de pó de pneu seja 20% inferior.

PA brilha na matéria de capa

PP com pó de pneu chega para mexer num vespeiro
Ferro: incógnitas em torno da degradação térmica.
Ferro: incógnitas em torno da degradação térmica.

“Peso e preço podem favorecer o composto de polipropileno (PP) com borracha micronizada, mas poliamidas (PA) levam vantagem em termos de temperatura e resistência à tração para uso na capa de isolamento acústico do motor de carros”, avalia Waldir Ferro, Doutor em Química e titular do time da subsidiária brasileira da italiana Radici, força motriz global na polimerização e beneficiamento de PA. Ele ressalva que suas ponderações são feitas com base estrita na entrevista (ver ao lado) concedida pela pesquisadora Kelly Cristina Lixandrão sobre sua formulação de PP com pó de refugo de pneu para a capa antirruído, aplicação que é ativo fixo mundial de PA com cargas minerais. No Brasil, por sinal o composto de PA da Radici assina a capa do motor de autos como o Jeep Renegade e Fiat Toro.

Ao apelo sustentável conferido pelo polímero reciclado e a sucata de pneu no composto de Kelly, Ferro contrapõe um desenvolvimento vitorioso da Radici: a combinação de PA com sílica obtida de um descarte de fonte renovável, a casca de arroz. Igualados os pratos na balança ambiental, o especialista da Radici passa ao terreiro da performance, com base no comparativo preliminar ilustrado no quadro ao lado.

Pelo crivo da análise termogravimétrica, observa Ferro, a degradação térmica de PP puro se inicia, em regra, por volta de 323ºC. Em seu experimento, ele segue, Kelly Cristina situa este processo a partir de 300ºC. “Isso nos leva a pensar que a degradação registrada é a do termoplástico, pois a borracha começa a degradar a 200ºC”, deduz. “Esses indicadores tornam pertinente um estudo dos efeitos sobre o composto de uma exposição prolongada a determinada temperatura, caso do ensaio heating aging, habitual na checagem de propriedades mecânicas de autopeças submetidas por períodos maiores ao calor”.

O acréscimo de pó de borracha reciclada, condiciona Ferro, só beneficia as características mecânicas do composto se houver interação química entre PP e o elastômero. “Aparentemente, um composto de PP com borracha natural micronizada carece dessa interação e, para ela ocorrer, aliada a ganhos nas propriedades mecânicas, uma saída é incorporar o agente compatibilizante utilizado na pesquisa”, assinala o químico. Na formulação desenhada por Kelly Cristina, pondera, o pó de pneu atuaria como um enchimento dotado de um trunfo diante da alternativa das cargas minerais. “A densidade da borracha é inferior à do talco,por exemplo”, constata. Como o pó em questão é preto, nota Ferro, o acabamento da capa antirruído deverá ser homogêneo e sem marcas muito evidentes de fluxo. À esta altura,ele diz, dois tópicos merecem atenção em particular: a resistência do composto ao risco e a performance da fluidez, “principalmente na injeção de peças com geometria de difícil preenchimento, caso dessa capa”.

O aumento da tenacidade do composto com borracha, considera o executivo, pode implicar maior resistência ao impacto e, por tabela, redução da tensão máxima no ensaio de resistência à tração. “PP sem carga já acusa baixo valor (cerca de 30 MPa) dessa tensão máxima perante plásticos de engenharia e, na hipótese de diminuição maior dessa tensão, ficaria inviabilizado o atendimento a especificações nas quais a tração é um quesito importante”, julga o analista da Radici. PA nunca foi presa fácil. •

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