O futuro não espera

A indústria brasileira de máquinas para plásticos periga passar da crise comercial à existencial

Em contraste com os elos de resinas e produtos transformados, o setor nacional de máquinas para transformação de plástico não se conhece. Ou seja, não possui indicadores oficiais de seu desempenho, das dimensões e do contingente de linhas em funcionamento nos transformadores. Como o setor de máquinas ofega sob excesso de oferta e níveis baixos de utilização da capacidade instalada entre seus clientes, continua forte a possibilidade de esse tipo de levantamento ser postergado. A falta de uma radiografia realista do setor e o risco de a defasagem tecnológica descarnar a competitividade dos fabricantes de máquinas nacionais, pressionados por capitalização a desejar e demanda idem, ameaçam colocar o setor em contagem regressiva se a recuperação da economia demorar muito, percebe na entrevista seguir uma viga mestra do ramo, Newton Zanetti, diretor da Pavan Zanetti, nº1 do país em sopradoras por extrusão contínua e de PET.

Zanetti: mercado não absorve novos fabricantes de máquinas básicas.

PR – Como avalia, após três anos de recessão sem trégua à vista, as condições da indústria brasileira de máquinas para transformação de plástico para acompanhar a intensa evolução dos equipamentos internacionais em termos de informatização, automação e integração de processos e operações? Qual o risco de a defasagem local ficar insustentável?
Zanetti – Essa é uma boa pergunta. Preocupada com a própria sobrevivência em busca de voltar a ter um capital de giro que garanta sua atividade, a indústria deixa naturalmente de lado os investimentos para o desenvolvimento tecnológico, principalmente os que exigem grande esforços de tempo e dinheiro. As empresas do setor de sopro convencional e de PET, onde atua a Pavan Zanetti, têm procurado não se distanciar muito das marcas mundiais, com investimentos menores mas mais dirigidos ao que realmente interessa. Ou seja, para que as máquinas produzidas aqui sejam competitivas e seu custo de produção não atinja as alturas. Posso dizer isso com base em nossa empresa: contatamos os principais fornecedores de elementos de máquinas, sejam hidráulicos, pneumáticos ou elétricos, para buscar as novidades mundiais acessíveis ao mercado local e sul-americano. Na montagem deste ano da primeira edição da feira Plástico Brasil, apresentamos máquinas com novidades em nossa linha tradicional, sempre tentando manter a competitividade nos preços, pois o mercado assim o exige. Mercado em baixa normalmente não leva os preços para o alto; inclusive um dos temas usados para convencer clientes relutantes em investir é a modernização das linhas e consequente ganho econômico. Ainda não vejo grande risco de ficarmos muito longe do mercado mundial de sopradoras. No entanto, é óbvio, que essa crise tem que passar, senão a discussão não será somente sobre a distância tecnológica em relação aos concorrentes europeus, mas sobre a própria sobrevivência do nosso setor.

PR – A indústria brasileira de máquinas para transformação de plástico sofreu drástico enxugamento no quadro de fabricantes. Não se viu movimento algum de novas marcas nacionais dispostas a disputar o espaço deixado por aquelas que ficaram pelo caminho. Porque o setor deixou de atrair esse tipo de investidor?
Zanetti – Poderíamos responder de duas formas. Ou não é um bom negócio ou o mercado não absorve mais concorrentes. Acredito na segunda hipótese, dado o momento difícil pelo qual o setor atravessa há três anos. Tomando meu segmento como referência, fabricar sopradoras exige conhecimento de processo, tecnologia e muita determinação. Não é fácil começar do zero e atingir um patamar de concorrência em pouco tempo. Também posso opinar sobre outra situação: as sopradoras atuais, em sua maioria, constituem unidades de produção que, em muitos casos, batem a produtividade de modelos em linha no passado recente. Isso reduz, lógico, a necessidade de fabricação de muitas máquinas, pois esses novos equipamentos produzem o equivalente ao desempenho der duas ou três sopradoras de tempos atrás, reduzindo a demanda. Para que haja no Brasil mercado comprador de mais unidades, devemos voltar aos níveis de 2010, quando a indústria não deu conta de corresponder à demanda de linhas.

PR – O que o setor não faz e deveria fazer para atrair talentos da nova geração? Como enxerga o notório desinteresse dos jovens hoje em dia por cursar Engenharia Mecânica ou outras especialidades relacionadas à atividade fabril ou de mecânica pesada, por exemplo?
Zanetti – Vou falar no âmbito da minha empresa Trabalhamos muito nisso, nos últimos três anos, com palestras em unidades do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e da Faculdade de Tecnologia de São Paulo (Fatec), além de cursos de tecnologia de sopro e injeção dentro de nossas instalações, na sede em Americana (SP). Recebemos constantemente escolas do setor plástico mostrando aos alunos como é uma fábrica de máquinas para transformação de resinas, tentando motivá-los. Sabemos há muito tempo, pois sempre patrocinamos jovens em cursos do Senai, que a preferência deles estava indo para eletroeletrônica, mecatrônica e TI. Mas sempre teremos o jovem talentoso em mecânica, embora esteja mais raro de achar. Encontrá-lo e motivá-lo é um desafio em tempos de crise. Nas palestras enfatizamos sempre a tecnologia que essas máquinas dispõem tentando motivar esse jovem. Nas feiras antigas, havia um dia destinado às escolas técnicas, caía principalmente nos sábados. Hoje em dia, devido ao alto custo das feiras, praticamente não damos mais atenção aos jovens que nos visitam nos estandes, pois estamos sempre visando a comercialização. A mudança dessa atitude pode ser uma ideia para estimular os novos talentos. É uma medida ao nosso alcance. No mais, não vejo o que podemos fazer para motivar jovens além do que já fazemos: apresentar palestras em escolas.

Tecnologia: lacuna entre máquinas brasileiras e a evolução global pode crescer.

PR – A Pavan Zanetti é uma indústria de controle familiar. Como avalia os desafios e dificuldades para atrair sucessores para a empresa e como é o trabalho de profissionalizar esses sucessores encaminhados para gerir a empresa e garantir sua perpetuidade?
Zanetti – No nosso caso, a segunda geração está na empresa e, obviamente, ficará difícil colocar a terceira geração no negócio, pois não há como ele absorver tantos herdeiros assim. A convivência se complica quanto mais membros das famílias controladoras houver decidindo e, para completar, há a falta de vagas no organograma para justificar um salario. A Pavan Zanetti é uma empresa média e não comporta tanta gente, ainda mais no setor administrativo. A tendência é a profissionalização parcial da empresa em postos chaves, mantendo a administração geral sobre controle familiar ou num Conselho. Acho que é a propensão natural para negócios de longa vida como o nosso, que está chegando aos 51 anos de atividade. Quanto às formas de atrair sucessores para o negócio, a minha experiência deixa essa questão em aberto.
Tenho dois filhos e somente o Rafael, engenheiro mecânico, trabalha na empresa no setor de desenvolvimento. Não o atraí com nenhum tipo de ação específica; creio que ele fez sua escolha devido ao convívio comigo e às suas constantes idas à planta. O mesmo se passou com os filhos do fundador Gumercindo Pavan, todos hoje na empresa. Minha filha faz doutorado de biomedicina na USP, pretende seguir carreira universitária e não pensa na fábrica.

PR – Nos EUA e Europa, é comum encontrar fundos de investimentos no controle societário de indústrias de máquinas básicas para transformação de plástico. As principais indústrias brasileiras desse setor podem não ser globalizadas nem ícones da tecnologia, mas têm a vantagem de atuar num dos grandes mercados emergentes do planeta. Por que, ainda assim, elas não despertam a atenção desse tipo de investidor financeiro?
Zanetti – Acho que os fundos ganham mais dinheiro em mercado financeiro no Brasil, um pais diferente da realidade dos EUA e Europa, onde os juros são pequenos quando não, negativos. Para atrair esses fundos por aqui, uma empresa de bens de capital teria que ser muito rentável para competir com o mercado financeiro e indústrias de outros setores. Na esfera da Pavan Zanetti, nunca procuramos ou fomos procurados por esse tipo de investidor. De outro ângulo, talvez não haja vocação entre os fundos para o risco desse tipo de atividade em que estamos envolvidos.

PR – O setor brasileiro de máquinas para transformação de plástico nunca teve dados oficiais para divulgar sobre o volume de vendas anuais de equipamentos nacionais e importados, de qualquer categoria, assim como não faz ideia da idade e quantidade de linhas no parque de máquinas em funcionamento no Brasil. Essa lacuna remonta aos tempos pré-internet. Tem cabimento mantê-la hoje em dia? O que o setor ganha com isso?
Zanetti – É claro que nada ganhamos com isso e sempre que precisamos trabalhar com esse tipo de indicador, não o encontramos e temos que avaliar de forma muito aproximada e com grande chance de erro. É uma boa pergunta a ser endereçada para a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). A ideia de um programa de modernização é sempre complicada e esbarra no pais na falta de estatísticas e de uma política industrial séria e detalhada. A única politica industrial recente foi a ideia do subsídio pelos juros da Finame, para modernizar o parque através de investimentos em máquinas e fábricas novas, mas deu no que deu. Grupos buscaram esses recursos para comprar outras empresas sem investir em máquinas, simplesmente trocando as instalações de controlador. Faltaram estabelecer limites para essas operações com dinheiro subsidiado que, no fundo, era para a renovação de linhas e geração de empregos. Mas essa é outra historia já conhecida … •

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