O buraco é mais embaixo

Para atrair o capital estrangeiro, é preciso bem mais que caras e bocas liberais

Nada como pixulecos no caixa para mudar a ideologia. Sem poupança interna e com o grau de investimento à beira do precipício, o governo recorre agora a meneios liberais para seduzir o ressabiado e escaldado capital externo. A capacidade de um país atrair esses recursos depende do seu quociente de risco e oportunidades de rentabilidade oferecidas – quanto maior o risco, maior o retorno. Na selfie global, o Brasil marca pelo alto risco, pois só consegue captar dinheiro de fora com juros na lua. Para esses investidores recolherem o pé mantido atrás, o primeiro passo é convencê-los de algo que ruiu com a compulsiva intervenção estatal na economia: a) a percepção de que temos regras claras e não violáveis ao bel prazer b) a visão do Estado não como produtor de bens e serviços, mas de infraestrutura para eles.
Abraçado com fervor nesses 13 anos, o capitalismo de Estado atrofia as empresas ao privá-las da seiva da produtividade: a concorrência num mundo tornado menor pelo progresso da tecnologia. Competência para enfrentar a parada a indústria brasileira tem. Sob recessão combinada com redução tarifária no governo Collor, por exemplo, ela conseguiu ajustar-se à disputa aumentada com importações, e um punhado de empresas brasileiras equipara-se hoje à nata global de seus setores.
O caos vem da organização política. Suas regras admitem, por exemplo, aberrações como um Legislativo que bate o ponto apenas de terça a quinta-feira ou um recorde mundial de cargos de confiança. O grosso de uma carga tributária de escalpelar o contribuinte é destinado a sustentar o mar de gorduras da máquina pública. Assim, gasta-se menos no que é essencial e, entre outras sequelas, alimenta-se uma burocracia surreal, ilustrada pelo deferimento em câmera lenta de licenças ambientais para obras, ou então, pela luta de MMA para se obter Ex-tarifário para importar máquinas sem similares locais. Nem um pio se escuta, por trás do atual discurso simpatia é quase amor pela abertura comercial, sobre desburocratização numa realidade regida pela TI, onde os negócios dependem da velocidade da sua tramitação.
A organização política também é a raiz dos escândalos recentes. Uma ala cita como prova da democracia existente apontar e penalizar os infratores. Outra corrente acha um fiasco uma democracia geradora de tanta transgressão, inflação e recessão. Os dois lados contêm pitadas de verdades, mas o xis da questão são as perdições criadas pela benevolência da estrutura política. Exemplo: o custo de qualquer campanha eleitoral bate os honorários que o mandatário receberá. Sob risco de quebra se não for magnata, o candidato recorre, sem objeções da legislação, ao reforço de quem nele enxerga um investimento a ser recuperado mediante fornecimentos para o governo. Deu no que está dando.
Por trás dessas e de outras, fica clara no Brasil a falta de uma organização sistêmica, em termos político e econômico, uma engrenagem de instituições que proporcione o que o cidadão quer em troca dos impostos pagos, de funcionamento eficaz a ponto de dispensar a necessidade de salvadores da pátria, urgência tão conhecida nossa. Feliz, já se disse, é o país cujo povo ignora quem é o ministro da Fazenda, mérito de mecanismos organizacionais bem azeitados. Por aqui, o ministro da Fazenda é sempre visto como a divindade paramédica que vai socorrer o país preso nas ferragens do último desastre. A sociedade não confia nos políticos e não muda de opinião a cada eleição.Mais uma prova dos furos de um sistema que estimula as rezas por um Messias. Vivemos recaindo no princípio de indução criado por Francis Bacon: se uma experiência leva aos mesmos resultados num grande número de vezes, é ultra provável que assim prossiga na próxima repetição.
Até quando? •

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