Não tem mais volta

O futuro dos plásticos de engenharia está sendo repaginado e o Brasil não escapa desse abalo sísmico
Não tem mais volta

Com status dourado por vendas anuais na média de US$ 1 bilhão, traduzidas em perto de 635.000 toneladas de mais de 20 bandeiras, a M.Holland, mega distribuidora de resinas dos EUA, trombeteia o ingresso na comercialização de filamentos para impressão 3D no bloco Nafta. Este movimento é sintomático da reviravolta, ameaçadora para a injeção e usinagem de plásticos, posta em andamento pela manufatura aditiva e o conceito 4.0 no mercado dos polímeros de engenharia, material prevalecente nos filamentos para a fabricação das camadas superpostas de peças tridimensionais (3D). A análise do transcurso dessa guinada, da qual o Brasil não escapa, e a competitividade dos componedores daqui, encalacrados entre a conjuntura instável e a velocidade vertiginosa com que se alastram as mutações da tecnologia, formam o prato de resistência servido nesta entrevista de Marcos Curti, diretor responsável pelo negócio de plásticos de engenharia da Solvay no continente americano.

Produtores de plásticos de engenharia hoje correm para lançar grades adequados a filamentos de impressão 3D. No momento, essa tecnologia é uma promessa mas, dada a velocidade com que amadurece, globaliza e se massifica, em quanto tempo acha que os filamentos 3D devem ganhar consumo em escala comercial nos países desenvolvidos?
Ouso dizer que já não estamos no estágio inicial desse processo. A transição de protótipos apenas para validação de conceito e design já evoluiu para protótipos funcionais, capazes de serem aplicados como peças prontas e que podem e devem ratificar a maioria dos requisitos finais de uma aplicação, no contexto de propriedades mecânicas e dimensionais e até da resistência química e elétrica. Hoje em dia, além de apoiar os novos desenvolvimentos dos clientes, já utilizamos aqui na Solvay equipamentos de 3D na condição de fornecedor de peças de reposição industrial para nossas plantas na Europa. A ascensão da manufatura aditiva permanecerá crescente, principalmente devido à contínua redução dos custos dos equipamentos de impressão.

Gigantes da química e petroquímica hoje investem em startups de impressão 3D, componedoras e recicladoras mecânicas e químicas. A verticalização na manufatura de filamentos 3D também traduz nova oportunidade de negócios para um fabricante de plásticos de engenharia?
É uma possibilidade, mas não creio ser o caminho que a indústria seguirá. Esses equipamentos tendem a estar cada vez mais próximos dos clientes finais e o seu custo permitirá uma grande capilaridade. Aqui vale muito a máxima ‘melhor ensinar a pescar do que dar o peixe’. No caso, os maiores objetivos dos fabricantes de matérias-primas são mostrar, através da sua expertise, o valor dessa tecnologia e o quanto ela economiza para a indústria no ciclo completo de desenvolvimento de uma aplicação, assim como zelar para que novos materiais estejam disponíveis para o avanço do desenvolvimento sob limites técnicos ainda mais desafiadores.

Feiras como a norte-americana NPE 2018 demonstram que máquinas de transformação de plástico estão gerando cada vez menos scrap no processo. Nessa trilha, o comércio de aparas industriais de materiais como plásticos de engenharia está entrando em contagem regressiva?
Para começar, gerar scrap é diminuir a capacidade de competir. Assim, há um esforço combinado dos fabricantes de equipamentos e dos consumidores em gerar cada vez menos refugo em linha e mesmo tratando-se de uma incidência mínima, utilizá-la ao máximo possível internamente. Dessa forma, sim, essa geração tende a diminuir, tal como já diminuiu muito nos últimos anos. Mas ainda persiste um amplo volume de materiais pós-consumo não tratados e que deve começar a atrair mais e mais a atenção de empresas voltadas a esse tipo de processo industrial.

O parque transformador no Brasil prima pela alta defasagem, um gap agravado pela recessão e que resultou em alta ociosidade e descapitalização do empresariado para atualizar suas linhas. Em contraste, a automação e informatização estilo 4.0 distanciam ainda mais as novas máquinas do nível do Brasil. Mantido esse descompasso, qual o impacto sobre o futuro da produção de peças de materiais de engenharia no país?
Não é uma verdade absoluta. Há um grande grupo de transformadores no país com tecnologia em dia ou muito próxima desse estágio. É claro que, a cada recessão, se perde de três a cinco anos de um ciclo de investimentos. De outro ângulo, os profissionais no Brasil são criativos e capazes de manter padrões de qualidade elevados, mesmo com equipamentos menos atuais. Quando se fala de conceito 4.0 podemos também considerar que as tecnologias estão mais acessíveis que nos primeiros estágios de automação da indústria, sendo possível adotar soluções inteligentes a custo competitivo. É um pouco similar ao que se vê com os conceitos de CRM (solução tecnológica para facilitar o trabalho do time de vendas e otimizar processos do setor comercial) e ERP (ferramenta para integrar e padronizar os processos da organização, otimizando a atuação de todos os setores). Há sempre um conceito que se adequa à capacidade do seu bolso. Eu creio que o maior desafio quando se fala de autopeças é a globalização das plataformas de produção. Elas tendem a ficar cada vez mais dispersas pelo mundo, em busca de escala, competência técnica e competitividade no custo.

Tem crescido, nos últimos anos, o número de recicladores, revendedores autônomos e distribuidores autorizados de resinas nobres que ingressaram na produção de compostos e blends no Brasil. Qual a sua interpretação desse movimento e como ele afeta o mercado de plásticos de engenharia, dos pontos de vista das peças originais e de reposição?
Creio ser a busca de um portfólio mais amplo de materiais para atender seus clientes tradicionais de resinas. É dificil competir com os grandes produtores integrados de polímeros nobres nos materiais de alta escala, mas, de outro ponto de vista, essas empresas do varejo acabam sendo uma solução para clientes que precisam de baixos volumes de materiais customizados. Com a evolução das escalas de produção de compostos e dos seus equipamentos, resulta pouco econômico para os grandes componedores fornecer pequenas séries. Há 25 anos, uma extrusora de beneficiamento na faixa 500 kg/h era algo normal em vários componedores de maior porte. Hoje em dia, equipamentos com produção inferior a 2.000 kg/h são vistos como pouco competitivos e precisam ser repensados na estratégia industrial.

Por quais motivos fusões e aquisições entre componedores de plásticos de engenharia são tão raras no Brasil, enquanto no I Mundo são ferramentas habituais para se conseguir economia e market share?
Escala e necessidade de capacidade adicional são alguns dos principais motivadores desse processo mundo afora. No Brasil, nem uma coisa nem outra ocorre até o momento. Como também não é visível qualquer grande composto em termos de inovação nas tecnologias existentes, este fator também não acaba se constituindo num eixo de investimento local nessa estratégia. A entrada de novos atores no mercado brasileiro pode ser um acelerador dessa tendência. Nos últimos anos presenciamos fusões e aquisições de players ocorrendo de modo amplo, mas com raros casos de sucesso. •

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