Mudou a fase da lua

A petroquímica mundial entra em um novo tempo, constata o consultor Paul Hodges

Está chegando a hora da verdade para as novas capacidades que devem, em pouco anos, alagar o mercado mundial de eteno e polietileno (PE) sem canais de desova à altura do prenunciado excedente. Uma tempestade da qual a América do Sul poderá tirar mais proveito na condição de mercado consumidor do que como produtor coadjuvante na petroquímica global. Esse novo tempo para o setor plástico é descortinado na entrevista abaixo por Paul Hodges, dirigente da consultoria britânica International eChem e blogueiro do site Icis, realizada pouco antes de sua vinda ao Brasil, como palestrante indicado por Plásticos em Revista para o seminário Encontro Anual da Indústria Química, realizado em 11 de dezembro pela Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim).

Hodges: excedente global de PE não será absorvido.
Hodges: excedente global de PE não será absorvido.

PR – Com que facilidade o futuro excedente norte-americano de polietileno (PE) será absorvido pelos mercados globais?
Hodges – Não acho que essa nova capacidade será absorvida pelos mercados. É sabido que o mercado norte-americano é maduro e incapaz de absorver por uma parte significativa do previsrto excedente. Ele vai então para onde? Veja o caso da China. Seu plano quinquenal, referente ao período 2016-20, está comprometido com o aumento da auto suficiência chinesa para 62% na cadeia do eteno, evidenciando que a necessidade de importar não passará então dos níveis de hoje em dia. Alguém por aí acredita que outros mercados possam responder pelo volume restante de PE?

PR – Acha que, em poucos anos após 2020, quando a grande onda da nova capacidade norte-americana de eteno/PE estiver operando regularmente, os mercados globais voltarão a estar receptivos?
Hodges – Não, isso é pensamento positivo. Nós nos habituamos ao constante crescimento da economia internacional entre 1983 e 2007, quando a população baby boomer (nascidos entre 1946 e 1964 na Europa, América do Norte e Austrália) entrou no grupo de 25 a 54 anos, faixa etária identificada pelo pico nos gastos e ganhos. Mas essas pessoas agora se aposentam. Assim, por volta de 2030, veremos no mundo 1 bilhão de integrantes da geração de 55 anos em diante. A essa altura, já possuem, em regra, a maior parte do que ambicionavam e sua renda declina de forma abrupta com o ingresso na aposentadoria. De onde virá então a nova demanda por PE? Eu fico com a previsão de um cenário de briga de cão, onde os produtores se engalfinharão por participações num mercado superofertado. Basta olhar para os mercados do petróleo e commodities metálicas para saber o que nos espera se todas essas novas plantas de PE entrarem em campo.

PR – Por quanto tempo acha que os preços baixos do petróleo persitirão? Aliás, o banco Goldman Sachs acena com a possibilidade de o barril bater em US$20. É razoável?
Hodges – O Goldman tem seguido minha posição desde o início do ano, quando reduziu de súbito à metade sua previsão do barril a US$ 42 – cinco meses depois de eu ter sido o primeiro antever que a grande virada nas cotações estava em curso. Agora ele vem atrás de mim de novo: por mais de três meses, tenho dito que os preços do barril retornarão aos níveis históricos de US$ 25. Por que? A razão fundamental é que reservas de óleo serão deixadas intocadas, tal como acontece com o carvão. E assim estamos no jogo pela participação de mercado. Os seis países árabes do Conselho de Cooperação do Golfo (Bahrein, Kuwait, Omã, Qatar, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos) perceberam isso e andam interessados em monetizar seus volumes de óleo.

PR – Quais as principais mudanças notadas nos padrões da demanda global por termoplásticos?
Hodges – Polipropileno costumava ser visto como a versão pobre de polietileno de alta densidade e, por diversas razões, saiu dessa moldura. Mas agora, com a chegada de um excesso de propano, PP está voltando à sua antiga imagem. No plano geral, há um grande potencial de substituição interpolimérica. Em princípio, PP, PEAD, polietileno linear (PEBDL), poliestireno (PS), PVC, PET e copolímero de acrilonitrila butadieno estireno (ABS) são substituíveis entre si. PP, por sinal, dispõe do maior potencial considerando-se PEAD, podendo assumir em torno de 30% das aplicações dessa resina. A vantagem no preço tende a fomentar inovações com velocidade. Outro suporte a este ponto de vista é o fato de que muitos transformadores, forçados pelo encarecimento e escassez de PP entre 2010 e 2013, quando ficou apertada a oferta dos produtos da corrente petroquímica 3 (C3- propano/propeno), passaram a trabalhar artefatos bem relevantes com PEAD. Fica claro que essas indústrias podem mudar de resina com rapidez. Mas ainda que, para tanto, as empresas tenham que compar novas máquinas, o investimento não é alto e o tempo de preparar a produção (lead time) é curto.

PR – Nesses novos tempos da petroquímica mundial a América do Sul está fadada a ser basicamente um mercado consumidor de resinas, mantendo-se como hoje um player irrelevante na produção?
Hodges – A América do Sul precisa adaptar-se à nova realidade e focar sua atuação pelo lado da demanda. Não há necessidade de se construir nova capacidade.Em lugar disso, a região deveria aproveitar o excedente global de resinas para conceber modelos de serviços empresariais para atender as reais necessidades de sua população – água, comida, saúde, mobilidade e moradia.

PR – A Argentina tem uma das maiores reservas mundiais de gás de xisto. Como encara a conveniência econômica e comercial relativa à exploração a curto prazo dessas jazidas visando a produção local de derivados como eteno e polietileno?
Hodges – A Argentina perdeu o bonde para esse investimento, exceto se alguma mudança tornar viável o gás natural a, digamos, US$ 2 /MMBTU. O mundo está se inclinando para o gás, portanto existe mercado para ele. Mas há uma super hiper oferta desse energético com base em toda a capacidade de gás liquefeito entrando no mercado mundial, tal como novos desdobramentos da rota norte-americana do gás de xisto. Essa situação da Argentina é mais uma ilustração do nosso argumento de que as indústrias petroquímicas precisam focar na compreensão das diretrizes da futura demanda, enquanto o suprimento se organizará por si mesmo. •

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