Com a mão na massa

Oásis para embalagens flexíveis, biscoitos, massas, pães e bolos industrializados tiram a crise de letra, demonstra o presidente da Abimapi.

Os setores de biscoitos, massas e pães e bolos industrializados movimentaram R$ 32,2 bilhões no ano passado, equivalentes a 3,37 milhões de toneladas. Apesar da recessão, os volumes das três categorias ficaram estáveis no primeiro semestre de 2015, cravando até algum avanço em valores. Sob a torrente de um noticiário de pavor, esses indicadores compõem um viagra para o astral dos produtores de embalagens flexíveis, detentoras do mando de jogo nesse campo, caso do segmento de polipropileno biorientado (BOPP). Na entrevista a seguir, Claudio Zanão, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Biscoitos, Massas Alimentícias e Pães & Bolos Industrializados (Abimapi), admite que possa té ocorrer troca de produtos ou migração entre marcas na cesta de compras, mas a população, em especial a classe C, não vai abandonar certos hábitos adquiridos sob a estourada bolha de populismo econômico de 2002 a 2014.

Zanão: consumidores substituem mas não abandonam os produtos na crise.
Zanão: consumidores substituem mas não abandonam os produtos na crise.

PR – Os setores de biscoitos, massas e pães e bolos industrializados apresentaram estabilidade em volumes e crescimento em valores no primeiro semestre. O avanço do faturamento é atribuído ao repasse do aumento de custos, como energia, combustíveis e matérias-primas no período. O aumento de preços foi suficiente para cobrir essa diferença?
Zanão – Foi suficiente, sim. Caso contrário, nossos associados teriam sérios problemas de caixa. Houve, de fato, aumentos substanciais nos custos de energia, combustíveis e mão de obra. Mas o que mais pesa é o câmbio, pois nosso setor é altamente dependente de trigo importado. Por isso, houve a necessidade de recomposição de preços. Entre o fim de fevereiro e o começo de março, os produtos tiveram aumento médio da ordem de 8%, incluindo biscoitos, massas e pães e bolos. Foi quando a absorção dessas altas nos custos ficou insustentável. Quando falo em 8%, me refiro a aumento médio. Ou seja, alguns nichos aumentaram mais, outros menos, a depender das características de cada setor e das estratégias de cada empresa. Temos aquelas que possuem estoque alto de trigo, farinha ou mesmo de produto acabado e, por isso, seguram o repasse de preço e conseguem ganhar participação de mercado. Outras, por sua vez, operam com necessidade imediata de recomposição e, assim, já foram obrigadas a reajustar.

PR – Acredita que o movimento será similar durante a segunda metade do ano, com volumes estáveis e novos reajustes de preços?
Zanão – Não temos notícias dos associados sobre novas reposições de preço. Cada vez que se aumenta o preço de um produto, há retração de vendas. Isso é normal. O impacto sobre o consumidor é direto e, portanto, ele procura alternativas ou marcas diferentes. Por isso, quando uma empresa aumenta preço, ela pode perder volume.

PR – Todos os segmentos sob o guarda-chuva da Abimapi crescerem, em valores, dois dígitos no ano passado, período de PIB praticamente nulo. Este ano, com previsão de retração econômica de até 2%, qual é a projeção da entidade para volumes e faturamento dos setores de biscoitos, massas e pães e bolos industrializados?
Zanão – Em relação a faturamento, esperamos crescimento de 2% a 3%, incluindo as três categorias representadas pela Abimapi. Cada produto, claro, tem características diferentes. Macarrão é produto básico, barato, todo mundo gosta e é fácil de preparar. Biscoito é um complemento ou substituto de refeição e engloba desde itens mais básicos, como os tipos água e sal ou maisena, até os mais elaborados, como cookies e waffers. Os tipos recheados são mais saborosos e prazerosos, por exemplo, e há os tipos com valor nutricional alto, como os produzidos com determinados cereais. Ou seja, atendem a todos os bolsos e gostos. Por isso, com a alta penetração nos lares de 99%, assim como o macarrão, o biscoito continua com desempenho estável. Já os pães e bolos têm uma característica diferente. Detêm 76% de penetração nos lares brasileiros, isto é, um quarto da população não compra um pacote de pão ou bolo por ano. Por isso, esse reduto tem inovado e crescido mais. O pão de forma do tipo integral ou com grãos caiu no gosto do consumidor e a categoria é muito reconhecida por lançamentos constantes. Todos esses produtos estão no dia a dia do povo e, talvez por isso, tenhamos passado esse primeiro semestre dentro da estabilidade. Como nossos associados haviam antecipado crescimento para 2015, muitos estão com desempenho abaixo do esperado, porém ainda estável com relação a 2014, tendência a se manter até o fim do ano. Tendo em vista a situação do país, é um ótimo resultado.

PR – O momento de crise favorece o consumo de embalagens de versões e tamanhos diferenciados, como monodose, combo ou tamanho família?
Zanão – Sem dúvida. O combo é fantástico. A rede McDonald’s foi pioneira nesse conceito. A pessoa chega para comer um sanduíche e acaba comprando também batata frita e refrigerante porque, juntos, esses itens têm um preço mais atraente do que se fossem adquiridos individualmente. O combo, na nossa indústria, de fato ajuda a vender. É o caso das embalagens “leve três pague dois”, por exemplo. A população enxerga isso como um produto-investimento. Mas nem sempre é verdade. Pode ser uma promoção para desovar os artigos. Já a embalagem individual veio atender, principalmente na área de biscoitos, aqueles momentos em que a pessoa vai comer sozinha, só quer lanchar ou buscar um alimento diferenciado. Essa versão deu muito certo. A indústria de panificação, aliás, está apostando nesse tipo de apresentação, como ilustram os bolinhos Ana Maria, da Bimbo. Eles chegaram ao mercado em embalagens menores, as chamadas monoporção. Embalagens individuais não oneram tanto o bolso do consumidor. O pacote cabe no bolso, naquele momento. Claro, se alguém for comprar um lanche para toda a família, a embalagem maior é preferível, pois terá melhor custo-benefício. Porém, se você está sozinho, não valerá a pena comprar 500g de pão, pois o produto tem validade menor.

PR – A Abimapi divulgou recentemente que, em tempos de crise, o brasileiro consome mais biscoitos recheados e do tipo cookie, produtos ligados à indulgência. Essas categorias terão desempenho melhor este ano?
Zanão – Não temos dados a esse respeito. Mas, de fato, o biscoito recheado é o mais vendido no Brasil. Mesmo com o cenário de crise, não deixará de ser comprado pelo consumidor. A indulgência é característica forte e bem atual. No entanto, nossa indústria precisa levar a mensagem de comer e beber com moderação. Se você gosta do recheado, não significa que precise comer três pacotes de uma vez. O monodose, por exemplo, satisfaz esse desejo. A moderação é importante na nossa cadeia de produtos. Migrar somente para produtos sem glúten também não faz sentido, é quase impossível. A moderação dentro disso é essencial para manter o consumo em todas as categorias.

PR – O fator indulgência não funciona com massas e pães industrializados, certo? Quais são então os fatores que podem favorecer suas vendas em crises como a atual?
Zanão – O macarrão é barato. Ele concorre com o arroz e feijão para variar o cardápio da semana. Acredito, também, que seu consumo durante dias de semana é improviso, por ser fácil e rápido de fazer. É um prato que todo mundo gosta e alimenta. Dependendo da pressa, a massa instantânea atende a necessidade de uma forma ainda melhor. Os pães, por seu lado, devido à penetração mais baixa nos lares, apresenta por ora crescimento mais acelerado. Além do mais, ter as opções ligadas à saudabilidade, como os pães com grãos, favorece o avanço. Os pães especiais e integrais estão tomando lugar do pão branco tradicional, pois as pessoas buscam alternativas saudáveis. O pão também não é restrito aos sanduíches; tem lugar em sobremesas, entradas, canapés e outros pratos. É muito versátil. Outra vantagem do pão de forma é o shelf life superior ao do pão francês de padaria.

PR – Considerando biscoitos, massas e pães e bolos industrializados, quais os nichos mais vulneráveis à recessão atual? Além disso, quais tipos de produtos que, nos últimos 12 anos, entraram na cesta de compras da classe C e agora, sob a recessão, sairão dela?
Zanão – Não acredito que produtos sairão dessa cesta de compras. O que pode acontecer é uma redução de volumes ou substituição. Claro que os itens estão mais caros e, em decorrência, pode ocorrer diminuição de frequência de compras. Um exemplo é a massa fresca, tipo mais caro. Mas, dentro da categoria, o consumidor opta por outras alternativas de massa. Se pessoas buscam opções saudáveis, podem escolher um macarrão integral ou, se estão com pressa, vão para o tipo instantâneo. Cada consumidor vai se adaptando, por isso as categorias não perderam volume de forma geral. Os consumidores substituem, mas não abandonam os produtos. Com os pães e biscoitos acontece o mesmo. São nichos com uma infinidade de opções.

PR – No reduto de massas, embalagens flexíveis dividem as gôndolas com as de cartão. Quais os prós e contras de cada uma delas?
Zanão – A massa seca representa aproximadamente 85% do consumo no Brasil, o que dá mais ou menos 1 milhão de t/a. Em segundo lugar, vem a massa instantânea e, por último, com cerca de 3%, as massas frescas. Dentro da massa seca, uma parcela entre 96% e 97% é grano mole. Conclusão: brasileiro não gosta de macarrão al dente, ou de grano duro. Se pensarmos em volumes, grano mole movimenta até 970.000 t/a. Os importados atuam somente na linha grano duro, com pouquíssimas exceções. Em regra, trata-se de produto com maior valor agregado, diferenciado e é fornecido em embalagem tipo cartão. Um associado nosso, a Barilla, importa o macarrão em caixinha da Itália e produz no Brasil o macarrão grano mole vendido em embalagem plástica flexível. A embalagem tipo cartão é em geral mais cara e o macarrão grano duro chega a ter um preço final três ou quatro vezes mais alto do que o grano mole. O brasileiro nunca será convencido a substituir o grano mole pelo duro devido à preferência cultural e ao preço. O trigo utilizado para produzir grano duro é diferenciado e só dá em certas regiões, o que também contribui para a elevação do preço. Com isso, podemos dizer que os produtores locais de macarrão, em sua vasta maioria, utilizam os filmes plásticos para embalagem.

PR – Acredita que o consumo per capita no Brasil para biscoitos, massas e pães e bolos industrializados irá cair este ano?
Zanão – Não, porque os volumes ficarão estáveis. Mesmo considerando o crescimento vegetativo da população e a manutenção dos volumes, a diminuição do consumo per capita seria muito pequena. Segundo nossa série histórica, estamos há alguns anos estabilizados nesse indicador. Biscoitos e pães cresceram um pouco mais, mas não há mudanças significativas.

PR – Nos últimos anos, impulsionada por programas tipo Bolsa Família e ganhos salariais acima da inflação, a classe C viveu uma bolha de consumo que minguou com a desaceleração da economia. O padrão de consumo de hoje em dia é a nova realidade do mercado brasileiro daqui por diante?
Zanão – Claro que não. O consumo será retomado. É uma característica de nosso povo, que se adapta facilmente. O brasileiro é muito experimentador.

PR – Como avalia o ritmo de lançamentos da indústria em um ano de PIB fraco? Em quais nichos os setores de biscoitos, massas e pães e bolos industrializados tendem a apostar mais?
Zanão – Em massas, não são esperados grandes lançamentos, porque o que faz a diferença é o preparo, o molho. Em compensação, biscoitos e pães exigem lançamentos constantes. Seja um pão com grão diferente ou um biscoito com alguma fibra. Além do mais, fabricantes traçam planos de lançamentos com muita antecedência. Como o brasileiro também gosta de experimentar, lançamentos são oportunidades em momentos de crise. O relançamento do biscoito Oreo, da Mondelez, é um exemplo de sucesso em nosso setor.•

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